O RIO DE JANEIRO NUMA LINGUAGEM DOCUMENTAL, EXPOSITIVA, DENUNCIADORA E ACIMA DE TUDO VISUAL/CORPORAL.
“Após 450 anos da fundação do Rio de Janeiro, o diretor MARCO ANDRÉ NUNES e o dramaturgo PEDRO KOSOVSKI, da AQUELA CIA. Pesquisaram as raízes da fundação da cidade para a concepção da peça Guanabara Canibal. Tendo como pano de fundo a tomada do Forte de Villegagnon, célebre batalha naval travada na Baía de Guanabara em 1560. A peça busca pensar e debater a questão indígena na atualidade. Ao redor de um toca-disco, eles escutam um áudio-documentário como nasceu o Rio, do repórter AMARAL NETO, que teatraliza a versão oficial da história com os “heróis nacionais”ESTÁCIO DE SÁ, PADRE NÓBREGA, JOSÉ DE ANCHIETA e tantos outros”.
“GUANABARA CANIBAL”, espetáculo em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil, é a terceira parte da trilogia da AQUELA CIA; que tem criado para a cena carioca, trabalhos emblemáticos.
O espetáculo fala sobre o massacre dos tupinambás, que resultou na fundação da cidade. Expõe olhares bem cortantes para o período da ditadura militar.
A AQUELA CIA. investe alto num trabalho a partir da dinâmica dos corpos, do visual cênico, com apoio forte da trilha sonora, executada ao vivo com inúmeros instrumentos e músicos mais do que competentes.
As cenas mostram o quanto a história do povo indígena sofreu um massacre cruel, e foram subtraídas suas existências, através de conflitos, pequenos duelos, visando poder e riquezas. Um ritual cênico expondo violências entre as guerras de 1565 e 1567, expulsando os franceses e destruindo os sonhos indígenas.
O espetáculo faz uma descrição das batalhas, usando muito fortemente um apelo visual, permeado com dramaturgia, com uma exploração corporal muito mais aparente do que o linguajar. Trabalho corporal e visual, juntamente com o sonoro, superam a dramaturgia. O texto de PEDRO KOSOVSKI fica calcado num teatro documental, denunciador.
MARCO ANDRÉ NUNES cria uma encenação/direção levada para o onírico, com grande beleza plástica e causando visibilidade para um olhar atento, sendo bem satisfatório. Direção musical de FELIPE STORINO impecável, fortalecendo a teatralidade e dramaturgia.
O cenário de MARCO ANDRÉ NUNES E MARCELO MARQUES, impacta num visual empoeirado, necessário para o relato de violências em guerras tão sangrentas. Uma poeira teatral que compõe perfeitamente a proposta executada.
RENATO MACHADO, com sua sempre iluminação icônica e de enorme potência, para definir e delinear a cena. MARCELO MARQUES e CARLOS PÉTIT colocam em cena figurinos com extrema correção e enaltecem o todo. Visagismo corretíssimo de JOSEF CHASILEW.
TONI RODRIGUES, com sua direção de movimento, impregnada de força cênica e definindo o rumo de um espetáculo calcado em lutas. Lutas corporais, emocionais e de sobrevivência. Põe seu trabalho em primeiro plano, juntamente com a trilha sonora e a desenvoltura corporal dos atores.
Um elenco extremamente satisfatório em suas intervenções performáticas. Emoção, concentração e corpos muito bem preparados para um trabalho exaustivo; CAROLINA VIRGUEZ, JOÃO LUCAS ROMERO, MATHEUS MACENA, REINALDO JUNIOR e ZAION SALOMÃO.
“GUANABARA CANIBAL” se coloca como um teatro documental irretocável, que expõe, denúncia e grita cenicamente. Gritos de voz, corpos, emoções e sobretudo com enorme dignidade.