Crítica Teatral de “Desatinos”

QUANDO A “ALUCINAÇÃO”, “DELÍRIO”, “INSANIDADE”, nos habita e nos faz lutar por uma dignidade merecida e almejada.

O espetáculo “DESATINOS” se apresenta dentro da Ocupação de Porta Aberta – de olho no nordeste, onde discursa, pondera, sobre espetáculos que promovem a dramaturgia nordestina, com idealização e curadoria de TOM PIRES.

“DESATINOS” aborda com muita delicadeza e força cênica questões como: Loucura, esquizofrenia, desrespeito, discriminação de indivíduos colocados à margem da sociedade.

Conceitos pré-estabelecidos que esmagam as convicções e esperanças de dias melhores.

Um espetáculo que discute vários aspectos das relações humanas.
Até que ponto os caminhos enveredados pelo ser humano, nos tira ou nos dá forças para lutarmos por ideais, e por uma mínima dignidade de sobrevivência.

O ator GERSON LOBO se debruça na vida e agruras, sofrimentos, de quatro personagens discriminados e mal vistos por uma sociedade preconceituosa e cheia de “máscaras”.

“DESATINOS” é uma tragicomédia que discorre em quatro contos sobre vidas relevantes e pertinentes, dentro da sociedade, em cidades brasileiras.

São eles:
– Um menino demoníaco: Mata animais com fogo.
– Um alfaiate: Manuel Flor revela suas ânsias e vê sua vida mudar com a chegada na cidade, de uma enigmática, excitante mulher.
– Um açougueiro: Antônio realiza seu sonho de ter um açougue, casa-se com uma prostituta e muda sua relação com os habitantes da cidade.
– Uma transexual: Criada num prostíbulo, Mariana expõe as transformações inusitadas que vive dentro de seu mesclado, complexo mundo que se insere.

A dramaturgia do pernambucano SAMUEL SANTOS é impecável, com linguajar coloquial, e simplicidade verborrágica. Escrita feita a flor da pele e muito tocante.

SAMUEL SANTOS também faz a direção/encenação, colocando o ator num desafio de grande expressividade. Com contornos e definições cênicas exatas, e percepção do espaço em palco. Delicada e aparente assistência de direção de WELLINGTON JÚNIOR.

A iluminação de BRISA LIMA e EDUARDO SALINO, parece vir dos céus, quase sempre na verticalidade , cortando o palco, apoderando o ator, a cena, e apoiando a atuação com extremo favorecimento do trabalho.
Os violoncelistas, música ao vivo potente, ampara o espetáculo e o carrega no colo. Um grande achado nos talentos de RAFAELA FERREIRA e GIBRAN MORAES. Fazem a diferença, dando a teatralidade dramática que o cenário proposto se coloca. Eles vão de ASTOR PIAZZOLLA, AVE MARIA etc. Um dos maiores méritos cenicamente. Comove. Tudo isso embasado na pesquisa musical de SAMUEL SANTOS e GERSON LOBO.

NANÁ SODRÉ aperfeiçoa, aprimora, a voz cantada do ator, com presença vocal, e nos presenteia com essa preparação e técnica. Um figurino mais do que eficiente de JAVA ARAÚJO. A descoberta do pano, echarpe, em volta do pescoço, é brilhante e se faz muito presente e multifacetada.

Vale destacar a simples e necessária produção de GERSON LOBO. Um monólogo abraçado e entranhado, arraigado no corpo, voz, alma do intérprete GERSON LOBO. Ele leva à cena um histrionismo urgente em sua performance que nos arrebata.

O espetáculo “DESATINOS” é um trabalho cênico/performático que tem urgência em ser descortinado e visto. Simples e ao mesmo tempo grandioso, com empatia, e sublime como cena teatral.
Os quatro contos de entrelaçam, se apoiam, e seus finais são surpreendentes.

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