Crítica Teatral de “Euforia”

QUANDO OS DESEJOS VELADOS NECESSITAM SE REVELAR, DIANTE DE UMA EUFORIA INCONTROLÁVEL.

O espetáculo EUFORIA com dramaturgia reflexiva de JULIA SPADACCINI, tem direção de VICTOR GARCIA PERALTA, e está em cartaz na pequena e acolhedora sala anexa do Teatro Sérgio Porto, Humaitá.

Um monólogo impregnado no corpo, na alma, nas vísceras do ator MICHEL BLOIS. O texto de SPADACCINI mexe, expõe dois mundos que fingimos não fazermos parte deles. 

Um texto tão delicado e necessário quanto nossa própria respiração. Um “beliscão”, um “acorda”, um “presta atenção”, um “olhe”, enfim, um reflita, no mundo que está ao seu lado, na sua frente, ou mesmo na sua vida. SPADACCINI criou uma dramaturgia para refletirmos o resto de nossas vidas.

Dois personagens de mundos tão diferentes e numa complexidade com igual delicadeza. Uma dramaturgia de excelência para bater em nossos ouvidos e acordar nossa percepção/reflexão. Expõe dois mundos ditos assexuados, invisíveis, inexistente, inútil. As palavras chegam em nossos ouvidos expondo desejos ainda vivos e possíveis, de um indivíduo idoso homossexual e uma deficiente física.

Uma ousadia corajosa com muita delicadeza, colocando em cena “problemas” que fazemos de conta não sermos nossos. Uma escrita poética, potente e tocante. Uma tetraplégica que inspirou a dramaturga, a partir de sua própria deficiência auditiva. 

Um idoso homossexual de 87 anos, num asilo, lutando com suas próprias lembranças de um passado repleto de libido sexual, que o atormenta e o acompanha em sua presente realidade desprovida de seus atributos físicos atraentes, diante de seu convívio com um cuidador que o instiga com seus devaneios provocadores.

A sexualidade em universos tão diferentes parecendo impossível, inatingível. Como lidar com o desejo sexual de um ainda vivo idoso, e uma jovem deficiente físico.
mundo desses dois personagens e saímos dessa aventura um pouco mais consciente e reflexivos.
Esse é o grande mérito desse simples/complexo/tocante e instigante monólogo.

A direção de VICTOR GARCIA PERALTA conduz o ator muito livremente para que o próprio, ilumine e dê notoriedade ao trabalho do diretor. Uma direção de coração aberto com talento e conhecimento. A iluminação de WAGNER AZEVEDO dá luz satisfatória aos dois personagens já iluminados por um caminho que o próprio trabalho se coloca e se faz impactante.

Cenografia criativa de ELSA ROMERO, com uma simplicidade de grande utilidade, manuseada pela desenvoltura cênica que o ator possui. Simples e eficiente.

TICIANA PASSOS impõe um figurino corriqueiro, dentro da proposta despojada, dando chance ao ator para explorar a cena com beleza visual. Servindo perfeitamente, com licença poética, para os dois personagens.
Trilha sonora, PEDRO GUEDES e RAFAEL LANGONI, colocada de forma sutil e apoiando a delicadeza do texto.

Como já disse; Um monólogo impregnado no corpo, na alma, nas vísceras do ator MICHEL BLOIS. BLOIS está pleno em cena, amalgamado com sua direção e apoderado da poesia inquietante da dramaturgia. A platéia respira com ele, no mesmo segundo. 

Sem usar nenhum artifício cênico, faz de sua presença um multifacetado de utilidades, de controle impressionante. Valoriza cada segundo em cena, colocando seu corpo no homem idoso e consequentemente na jovem deficiente, com uma inteligência teatral pertencente a um intérprete apoderado de seu ofício.

“Direção e a dramaturgia foram criadas em conjunto, conforme a demanda da interpretação”. Enfim, uma performance cênica de grande impacto, carisma e sensibilidade.

EUFORIA é um espetáculo de simplicidade aparente e de urgência imediata. Um “nada” cênico, que tem três ingredientes irretocáveis que sustentam o fazer teatral; Direção, e os primordiais, DRAMATURGIA E ATOR.

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