Crítica teatral de “Os sete gatinhos”

A ÂNSIA DE UMA FAMÍLIA. UM CENÁRIO RODRIGUIANO PERFEITO, DESPUDORADO E DESMASCARADO.

O espetáculo OS SETE GATINHOS está em cartaz no recém inaugurado Teatro Nelson Rodrigues, depois de um tempo com suas portas fechadas.
A montagem feita pela CIA. TEATRO DO ESPLENDOR, dirigida e fundada pelo respeitadíssimo ator/diretor BRUCE GOMLEVISKY, que faz sua primeira encenação de um texto nacional.

A CIA. está a algum tempo debruçada na proposta de estudar, e colocar em cena os processos de degradação e violência. Agora nos presenteia com um apuradíssimo trabalho técnico e interpretativo de um autor nacional.

OS SETE GATINHOS deu origem a chamada “tragédia carioca”, que nos remete às tragédias gregas, sendo adequada a realidade do subúrbio do Rio de Janeiro. Com forte presença do erotismo e desmascarando a ânsia de uma família residente no Grajaú. Uma história que revela o ser humano dominado por um capitalismo avassalador e despudorado.

O texto do dramaturgo pernambucano, é um dos que alcançou maior sucesso e visibilidade dentro de uma obra composta por 17 peças teatrais.
NELSON constrói uma tragicomédia com todos os ingredientes que fazem uma família apodrecer, se revelar.

Um dramaturgo polêmico, incomum, “impróprio”, com características muito particulares em suas obras. Sua maneira única de ver, sentir, desmascarar as pessoas dentro de uma sociedade.

NELSON expõe o ser humano com uma transparência que nos choca. Retira nossas máscaras e escancara nossos desejos sexuais mais íntimos e perturbadores. Uma coragem extremamente desprovida de nenhum pudor. Um gênio na exposição de nossos desejos mais secretos.

O dramaturgo fez uma transposição da tragédia grega para a sociedade do Rio de Janeiro, sob uma ótica moderna, contemporânea e coloquial. OS SETE GATINHOS é uma obra teatral que trata da relação virgindade / prostituição. Uma família suburbana, onde a figura paterna, não mede esforços para preservar a “pureza” de sua filha caçula. As quatro filhas mais velhas, são “obrigadas” a se prostituir, para custear a educação da filha mais nova em um internato. A partir daí, todas as falsas aparências são evidenciadas, e desnuda as atitudes e ânsias sexuais de cada personagem. Incesto, violência doméstica, desejos reprimidos, são levados a cena, fazendo da obra uma verborragia mais do que atual.
BRUCE GOMLEVISKY cria uma encenação/direção com todos os ingredientes rodriguianos. Um perfeito jogo cênico direcionado com muita maturidade e com uma força em cena despudorada que o próprio NELSON RODRIGUES deve estar aplaudindo. Uma encenação com desenvoltura e coragem, cheia rítmos lúdicos e precisos. Um conhecedor do universo de NELSON, sem pudor, e com muito talento e teatralidade.
O espetáculo prima por um elenco de entrega total, desenvolto em corpos, em ações cênicas. Intérpretes confiantes e debruçados numa proposta ousada, porém, totalmente cheia de êxito e envolvente. Todos defendem com unhas e dentes seus personagens, com muita sabedoria e desprendimento.

Vale muito destacar os veteranos e imprescindíveis; TONICO PEREIRA, ALICE BORGES, JAIME LEBOVITCH, LUIZ FURLANETTO e LOURIVAL PRUDÊNCIO. Aplausos de pé para os demais; LUIZA MALDONADO, GUSTAVO DAMASCENO, KAREN COELHO, INGRID GAIGHER, THIAGO GUERRANTE, LOUISE MARRIE e PATRICIA CALLAI.

A cenografia de FERNANDO MELLO DA COSTA, evidência bem a decadência da história, expondo claramente a realidade crua, um cenário realista na sua ocupação na cena. Retrata exemplarmente a família em decadência. Uma cenografia conectada com o texto. Móveis amontoados, com grande beleza teatral.

Trilha sonora de FELIPE COTTA e ANDRÉ SILVESTRE bem ambientada com a proposta. CAROL LOBATO propõe uma indumentária bem condizente a encenação e dramaturgia.

Iluminação de WAGNER PINTO potencializa o acerto da direção e enaltece o universo do texto. Evidência o jogo dramático e as atitudes em cena.
OS SETE GATINHOS é sem dúvida um presente dentro do cenário teatral carioca. Um acerto de grandes e plausíveis profissionais da cena teatral. Imperdível.

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