Crítica Teatral de “O rei da glória”

UM “REI” EM BUSCA DE UMA “GLÓRIA” HÁ MUITO PERDIDA, PARECENDO INALCANÇÁVEL. UMA ODE A INVISIBILIDADE HUMANA.

“O REI DA GLÓRIA”, cena teatral onde:
“Um pastor, um homem que mora numa árvore, uma mulher sinestésica e apaixonada, uma virgem grávida, e um ator que também é MC. Todos eles tem algo em comum; são personagens do mesmo bairro, retratados em um falso documentário feito por um traficante, que vende objetos usados, na calçada do bairro da Glória”.

Espetáculo criado a partir de uma aparente e profunda pesquisa de linguagem do ator e diretor ANDERSON CUNHA, que escreve um monólogo/crônica/poética.

Na dramaturgia de ANDERSON CUNHA, presencia-se uma narrativa fazendo uma ode a invisibilidade humana e ao verbo/dicionário, sobrepondo-o a bíblia/palavra.

Uma proposta rascante, num texto que não usurpa o teatral.
Um palavreado nada velado, denunciador, em personagens contemporâneos, reais, visíveis.

O humano invisível ganhando uma dimensão a holofotes potentes. Uma sintonia entre escrita dramatúrgica, face ao espectador, misturando sensações diversas e similares.

O texto questiona e expõe à intolerância, pobreza, marginalização, e uma auto destruição humana na presente contemporaneidade.
Uma narrativa no cruzamento das personagens que transitam na crueldade urbana.

Uma dramaturgia lapidada como uma pequena jóia que se perpetua.
O ator/dramaturgo interpreta as cinco personagens masculinos, e em locução off se apresenta outras duas femininas.

Uma atuação em jogo lúdico cênico, inventivo e inteligente. Modula vozes na necessidades dos transeuntes urbanos, e o corpo do ator acompanha cada nuance interpretativa. Uma exposição teatral sagaz em plausível performance.

A direção de GUILHERME MIRANDA parece deixar-se embrenhar, se arrebatar, no caminho percorrido pelo ator. Um caminho apontado pelo diretor, onde os dois acertam o alvo teatral.

A direção de arte de RONALD TEIXEIRA se coloca, juntamente com o cenário, numa instalação cênica de grande inventividade e agradável aos olhos. Uma “parafernália” de objetos que dizem a que veio e valoriza o todo. Em tons nas cores marrom, terra, cenário e figurino se complementam e ficam totalmente dentro do contexto proposto.

Cenografia/cenário e figurinos de RONALD TEIXEIRA e GUILHERME REIS.
PAULO CESAR MEDEIROS cria uma iluminação intimista e condizente com o mundo das personagens. Um intimismo de expressão, elevando à cena.
Direção de movimento de CLARICE SILVA conduz com delicadeza precisa o corpo de um ator sensível.

Poderosa e aparente em modulações, o trabalho da fonoaudióloga LUISA CATOIRE.

Trilha sonora de GUILHERME MIRANDA e ANDERSON CUNHA na sensibilidade e sinuosidade de um trabalho bem cuidado.
Destaca-se a dignidade e bem colocada produção de ANDREIA FERNANDES e LYA BAPTISTA.

“O REI DA GLÓRIA” é um espetáculo que no invisível dá enorme visibilidade à cena teatral carioca.

Vale refletir na frase da dramaturgia:
“E ASSIM A REFLEXÃO FAZ TODOS NÓS COVARDES”.

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