Crítica de Dança “Rosário”

O COREOGRAFAR EM COMPASSOS CORPORAIS E EMOCIONAIS, DAS OBRAS VISUAIS/PLÁTICAS, DE UMA LOUCURA EM GENIALIDADE ARTÍSTICA.

A dança contemporânea, encerra a trilogia sobre grandes nomes das artes visuais(FRIDA KAHLO, JEAN-MICHEL BASQUIAT e BISPO DO ROSÁRIO), criada pelo bailarino, coreógrafo e artista plástico MÁRCIO CUNHA.
Em cartaz no Sesc Copacabana: “ROSÁRIO”, espetáculo sobre o universo do artista plástico brasileiro/nordestino, ARTHUR BISPO DO ROSÁRIO, hoje, reconhecido internacionalmente, pela sua obra vanguardista, feita a partir de “lixos, sucatas e descartáveis”.

A linguagem dos movimentos/dança, impulsionou MÁRCIO CUNHA a desvendar vida e obra do BISPO, que foi diagnosticado com esquizofrenia, e passou 50 anos internado na colônia psiquiátrica Juliano Moreira/Jacarépagua, onde em meio às suas loucuras, ânsias, crenças, devaneios, intuições, dores, choques elétricos e agressões, construiu um legado muito peculiar/particular/intuitivo, sobre sua visão do mundo. Obras confeccionadas em coloridos intensos, criações visuais, mais tarde reconhecida pelo mundo.

Para criar o espetáculo, o coreógrafo, submergiu sua sensibilidade, vivendo como interno da colônia psiquiátrica, em uma residência, onde esse fundamental contato, o ambiente com outros internos, proporcionou-lhe cabedal de visceralidade única. 

Criou à concepção, coreografias, direção, e sendo o intérprete de “ROSÁRIO”. Assistente de direção JULIANA NOGUEIRA.

Leva à cena dessa criação multifacetada, expressiva e tocante, em estrutura coreográfica/dança, contando com um dos internos da colônia, ARLINDO, artista que chegou a conhecer BISPO DO ROSÁRIO, em um trabalho visual, muito similar com o do BISPO. 

ARLINDO, dá importante visibilidade ao espetáculo, permeando toda à cena, em presença que nos remete a um “mentor” do desembaraçar cênico.

MARCIO CUNHA criou em seus movimentos coreográficos às sensações e os anseios delirantes contidos nas obras do artista plástico. Gestuais que buscam retratar à exclusão do artista, por uma sociedade que o renegou, suas dores físicas e d’alma, e sua criatividade artística.

Montou uma instalação cênica, junto com à artista SILVIA ARAÚJO. Interage em vísceras com a potência dessa instalação, e a partir dela, o refletir pertubador na essência visual/intuitiva do BISPO.

A dança, como força motora de um trabalho de múltiplos recursos; artes plásticas, teatro, dança, música, em confluência, e se alimentando, entrelaçando e potencializando à arte, tendo como inspiração uma das maiores sensibilidades, na época tratado como louco/incapaz/inútil. Em sua “demência” e genialidade, o sergipano ARTHUR, revolucionou em obras feéricas/deslumbrantes. Faz das artes plásticas brasileira, um épico acontecimento, apesar de ter sido tão vilipendiado/ultrajado.

Dentro do valioso legado do BISPO, o coreógrafo MARCIO CUNHA, evidência na cena corporal, às danças populares que ficam intrínsecas no desenrolar compassado, de movimentos típicos do maracatu, frevo, dança do boi, Capoeira, e todo um gestual de longa pesquisa, desfrutado em coreografias e dramatização.

A concepção, direção e atuação de CUNHA, é reverberada em explosão muscular, coreografias calcadas no seu vigor físico, emocional, em um esgar de corpo, preparado em desenhos simples, com força teatral, colocando às danças populares em fulgurante importância. Explora nossa cultura folclórica nordestina em desenlace com enorme fluir.

As questões corpo/mente, sociais/exclusão, e com presença intensa do espiritual, enfocando várias religiões, com sensações, dores, aproximam e unem, com usufruir/posse, seu mergulho de beleza expressiva, fruto do trabalho em sua trilogia.

O videografismo de GUTO NETO se coloca com afluência num adaptar perfeito na intersecção com as várias linguagens expostas. Uma importante junção teatro/ cinema/ dança, conta parte da história do BISPO através das imagens projetadas, com atuação em vídeo de MARCIO CUNHA e ARLINDO, no espaço da colônia.

CACAU GONDOMAR realiza uma direção de produção além do esmerado. Vocação em favor do concretizar artístico.

O desenho de luz de JUCA BARACHO é de minúcia genial, dando cintilância ao investigar coreográfico, na imersão de entrega físico/ emocional de “ROSÁRIO”.

ANTONIO NÓBREGA sacraliza em sua trilha sonora toda a religiosidade impregnada, ao desfiar/ destrinchar, com músicas do nosso cancioneiro nordestino. Funciona como uma poderosa/ abundante oração, que abrange um pouco de cada crença religiosa. Comunhão total com a beleza cênica da cenografia/ instalação. Artistas e técnicos comungam no mesmo caminho, em proposital e ardiloso interagir com o público.

“ROSÁRIO” é uma oração cênica de intencional espiritualidade/ discursão/ criação/ arte, se utilizando corporalmente em dança cristalizada e apoiada em múltiplas linguagens, de finalização memorável, em destemido ousar cênico.

Um documentário corajoso, dançado, interpretado, de obras artísticas, em corpo, alma, religiões e movimentos esculpidos, descortinados com o “Manto Sagrado”, à vida e o legado de ARTHUR BISPO DO ROSÁRIO.

Espetáculo NECESSÁRIO.

– Sesc Copacabana- Sala Mezanino.
– De: Quinta à sábado às 21:00 horas e domingo às 20:00 horas. Até 01 de julho.

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