Entrevista NECESSÁRIA:
Ator, Diretor, Dramaturgo e Roteirista – DANIEL DIAS DA SILVA.

No palco do Blog/Site, sob os holofotes do projeto – Entrevistas NECESSÁRIAS – um dos diletos em competência, que abarca trabalhos de extremo necessário para o cenário cultural.

Daniel Dias da silva é formado pela Universidade do Ceará – em Arte Dramática.

Radicou-se no Rio e trabalhou com diretores exponenciais: Gracindo Junior, Marcus Faustini, Luiz Arthur bunes, Walter Lima Junior.

Atuante em linguagens díspares – teatro, tv e cinema. No cinema tem feito diversos trabalhos com Glauber Filho, inclusive como roteirista.

No teatro, esteve no elenco de vários espetáculos como “Viúva, Porém Honesta”, direção de Bruno Correia Lima, ‘Um Sopro de Vida’, dirigido por Roberto Bomtempo, “O Santo Parto”, de Lauro César Muniz, direção de Luiz Arthur Nunes e, mais recentemente no infantil “O Príncipe Poeira e a Flor da Cor do Coração”, de Saulo Sisnando, com o qual foi indicado ao Prêmio CBTIJ 2019 de Melhor Ator Coadjuvante. 

É autor de peças e roteirista; “Oropa, França e Bahia” (adaptada para longa-metragem, com direção de Glauber Filho), “Eu Sou Mais 500”, “A Terra é Azul” e “Uma Canção Para Eulália”, entre outros. 

Durante sete anos (2008-2015) ocupou o cargo de diretor do Teatro João Caetano, um dos mais antigos e importantes teatros do Rio de Janeiro, paralelamente com sua carreira artística. 

É um dos criadores da Lunática Companhia de Teatro, onde atuou e produziu os elogiados espetáculos “Matador”, de Rodolfo Santana 

(direção de Herson Capri e Susana Garcia); “Esse Vazio”, do argentino Juan Pablo Gómez, com direção de Sergio Módena.

Ainda com a mesma companhia dirigiu “O Princípio de Arquimedes”, do catalão Josep Maria Miró. O último espetáculo do grupo foi “O Cego e o Louco”, de Claudia Barral com direção de Gustavo Wabner.

Como diretor, passeou por diferentes estilos e linguagens, em diversas peças, como “A Moratória”, “Depois Daquele Baile”, “Dirigir-se aos Homens”, “Cícero – A Anarquia de Um Corpo Santo”, “Acabou o Pó”; além de ter se dedicado também ao teatro para crianças: “Êta, Seu Bonequeiro”, “Caqui – Uma Fábula Circense”, “Boi da Cara Preta”, “O Duende Rumpelstiltiskin”, “O Gato de Botas – O Musical” e “Feiona – A Princesa Lindona”.

Temos aqui, no palco do Blog/Site as cortinas abertas para:

O Ator, Diretor, Dramaturgo e Roteirista;

Daniel Dias da Silva.

 

Daniel Dias da Silva.

 

Daniel Dias da Silva

 

 

 

Entrando na – Entrevista NECESSÁRIA – com:

DANIEL DIAS DA SILVA

 

 

 

 

F.Fachetti – “Passeou em diferentes estilos de linguagens”: monólogo, clássicos, comédia. Qual desses estilos que mais te desafia na direção e diga os porquês.

Pode nos falar do seu processo na direção e por que resolveu dirigir os espetáculos: “A Moratória”; e também os infantis, que tem outro lugar na cena – caminhos bem díspares para os palcos, muito diferente dos clássicos, por exemplo. Fale do infantil: “Caqui, Uma Fábula Circense”.

 

DANIEL DIAS DA SILVAEu sempre gosto de pensar que o maior desafio está no próximo trabalho, seja ele uma comédia, um monólogo, um clássico ou até mesmo um infantil. Cada novo espetáculo traz novos desafios, novos aprendizados e gosto de me arriscar, me colocar em movimento, aprender, compartilhar experiências e visões e me aprofundar em algo novo. O maior risco é quando você acha que não existem dúvidas e que está confortável.

A ideia de montar “A Moratória” , de Jorge Andrade, partiu do ator e produtor Wilmar Amaral, um homem que dedicou sua vida inteira à medicina e, já na maturidade, decidiu se arriscar pelo teatro, sua antiga paixão. Era um sonho dele encenar este texto, uma referência da nossa dramaturgia, um drama familiar com toques autobiiográficos.

“A Moratória”.

“A Moratória”.

“A Moratória”.

 

A peça é um dos melhores textos que conheço e tem como pano de fundo um momento histórico do país: a crise do café, com a transferência do poder econômico do campo para as cidades e a reconfiguração da elite do país. Através desse choque entre duas realidades, o texto discute ética e valores nessa nova sociedade.

Eu não tinha como dizer não àquele convite e pude reunir uma equipe incrível, um elenco maravilhoso de jovens atores, como Gabriel Gracindo, Fernanda Guimaráes, Leonardo Netto com nomes experientes, como Suely Franco, Theresa Amayo, Susana Saldanha. O Gracindo Junior, fez a supervisão cênica. Foi uma experiência muito especial.

“A Moratória”.

“A Moratória”.

Eu tenho uma relação muito especial com o universo do Teatro Infantil (particularmente, prefiro chamar de Teatro para a Família), acredito no poder do teatro e da arte na formação desse público, do seu senso crítico, da construção de um ser humano mais completo.

Alexandre Lino como “O Duende Rumpelstiltski”. Texto: Daniel Porto. Direção: Daniel Dias da Silva.

Espetáculo Infantil: “O Boi da Cara Preta” – de Bárbara Duvivier. Direção: Daniel Dias da Silva.

 

Diferente dos adultos, as crianças estão mais receptivas ao lúdico, estão mais abertas às emoções, mas, por outro lado, também são mais diretas e sinceras, não se deixam enganar facilmente: deixam muito claro se gostam ou não, se perceberam uma falha ou um problema. Por isso tenho tanto respeito por elas, não é fácil chegar até elas, mas é gratificante quando conseguimos fazê-las embarcar na fantasia.

Infantil: “O Duende Rumpelstiltsk – Direção: Daniel Dias da Silva. Texto de Daniel Porto. Na foto: Alexandre Lino e Ana Paula Santanna. Foto: Janderson Pires.

Infantil: “O Gato de Botas” – Com Andreia Veiga. Direção: Daniel Dias da Silva.

Chris Penna no personagem “O Gato de Botas”.

Infantil: “Êta, seu Bonequeiro” da Cia. Nós nos Nós. Direção: Daniel Dias da Silva.

Espetáculo Infantil: “Êta, seu Bonequeiro”

 

 

F.Fachetti – Fale do infantil: “Caqui – Uma Fábula Circense”.

 

Daniel Dias da Silva“Caqui – Uma Fábula Circense” falava sobre um menino que se recusava a crescer e, por isso, se escondia em um caqui. A peça, escrita por Gamba Junior, foi um projeto da Companhia Nós nos Nós, com quem realizei alguns trabalhos e que mesclava a linguagem teatral com técnicas circenses. Então, além dos desafios normais de qualquer trabalho, havia uma pesquisa de técnicas de circo, como acrobacia aérea, malabarismo e perna de pau, na construção dos personagens, o que tornava o espetáculo ainda mais encantador para os pequenos.

Infantil: “Caqui – Uma Fábula Circense”- Direção: Daniel Dias da Silva. Na Foto: Gamba Junior, Miguel Carvalho, Vania Penteado, Danielle Siqueira, Mariana Hartung e Claudio Bittencourt.

Infantil: “Caqui – Uma Fábula Circense”.

 

 

F.Fachetti – Diretor assistente – esse acólito/auxiliador que pode ter uma decisiva referência no trabalho – te deu um cabedal de peso ao lado de diretores como: Gracindo Junior, Marcus Vinícius Faustini, Walter Lima Junior, Luiz Arthur Nunes ( O Santo Parto) etc.

O que capturou desses diretores como ponto nevrálgico que definiu os caminhos na direção de Daniel Dias da Silva.

Fale um pouco do espetáculo “O Santo Parto” e seu acompanhamento como assistente de Luiz Arthur Nunes.

 

DANIEL DIAS DA SILVA– Eu tive a sorte de trabalhar ao lado de grandes mestres e aprendi muito com cada um deles. Como Assistente de Direção, temos a possibilidade de acompanhar e colaborar em todas as fases que envolve o processo criativo de construção de um espetáculos, desde a primeira leitura até o dia a dia do espetáculo já pronto. É um exercício muito rico, pois o Assistente de Direção assume para si uma concepção artística que não é a sua (eventualmente pode coincidir ou não com o seu olhar), ele busca entender como o Diretor enxerga o espetáculo e tenta colaborar para se atingir aquele resultado desejado. Dependendo da relação e do tipo de dinâmica, ele aponta falhas, traz contribuições, auxilia na preparação dos atores e aprende como solucionar os desafios.

Meu primeiro trabalho como Assistente de Direção foi no espetáculo “Raul Fora da Lei”, com o Roberto Bomtempo e direção do José Joffily. Era um espetáculo musical de pequeno porte que repassava a vida e a trajetória artística do cantor Raul Seixas.

O Joffily tem uma carreira consolidada no cinema, que tem uma dinâmica própria e eu tentava “traduzir” esse olhar e essa percepção dele para o palco. Ao mesmo tempo, o Bomtempo é o tipo do artista que se joga, se produz, se lança e tem prazer em partilhar o que sabe. Com “Raul Fora da Lei” pude viajar pelo Brasil, aprendi a operar som e luz, aprendi a montar um palco, aprendi a importância da disciplina, do comprometimento com o trabalho, como precisamos respeitar cada pessoa da equipe e o palco em que pisamos, pude ver o empenho diário para manter um espetáculo de pé. Aquela experiência valeu por um curso inteiro de teatro. A amizade com o Roberto Bomtempo rendeu muitos outros frutos: demos aula juntos, dirigimos juntos e nos revezamos no palco substituindo um ao outro por duas vezes.

Espetáculo: “Raul Fora da Lei” – Daniel Dias da Silva como Assistente de Direção de José Joffily. Monólogo com Roberto Bomtempo.

 

Depois disso pude trabalhar como assistente do Marcus Vinícius Faustini, que conheci em um curso que ele ministrou.Juntos fizemos trabalhos pequenos como uma versão de “A Hora da Estrela”, até um musical gigantesco, o último texto escrito pelo Gianfrancesco Guarnieri, chamado “A Luta Secreta de Maria da Encarnação”, com um elenco enorme, orquestra, coro e desafios proporcionais ao tamanho da produção. Por conta desse trabalho, morei em São Paulo por alguns meses e pude conhecer também a realidade e artistas de lá.

“A Luta Secreta de Maria da Encarnação”, de Gianfrantesco Guarnieri. Daniel Dias da Silva como Assistende de Direção de Marcus Vinícius Faustini.

Foto de divulgação da peça “A Luta Secreta de Maria da Encarnação” – musical de Gianfrancesco Guarnieri. Direção: Marcus Vinícius Faustini e como Assistente de Direção: Daniel Dias da Silva.

 

E, assim, fui emendando um trabalho no outro, às vezes repetindo parcerias, como o Walter Lima Junior (outro cineasta que abraçou o teatro), com quem fiz dois trabalhos: “Dois na Gangorra” e “Fica Comigo Esta Noite” e o Luiz Arthur Nunes, com quem trabalhei em “O Santo Parto”, uma comédia de Lauro César Muniz que tocava em temas muito delicados, como religiosidade. O Luiz Arthur Nunes traz uma bagagem intelectual e uma vivência que sempre me fascinou, com muita segurança do que queria e uma calma surpreendentes. Em “O Santo Parto” ainda encarei o desafio de substituir o Roberto Bomtempo durante uma turnê da peça.

“Fica Comigo Esta Noite”, de Flavio de Souza. Em cena Murilo Benício e Marisa Ortz. Direção: Walter Lima Junior. Assistente de direção: Daniel Dias da Silva.

 

Espetáculo: “O Santo Parto” – Daniel Dias da Silva como Assistente de direção de Luiz Arthur Nunes e substituiu Roberto Bomtempo na turnê.

Espetáculo: “O Santo Parto” – em cena com Sergio Maroni e José de Abreu. Peça de Lauro Cesar Muniz. Direção de Luiz Arthur Nunes.

 

Mas eu não posso deixar de comentar aqui sobre o meu encontro com o Gracindo Junior, que sempre digo que foi meu “padrinho” nos palcos cariocas. Trabalhamos a primeira vez na montagem de “Com a Pulga Atrás da Orelha”, uma super produção, uma comédia enlouquecedora, com um elenco de cerca de dez pessoas, das mais variadas origens e estilos.

A peça rodou o país e fez um sucesso impressionante. A sintonia com o Gracindo foi tão grande que trabalhamos juntos em vários outros espetáculos e fui acolhido por ele e pela família de uma maneira que não tenho como dimensionar. O Gracindo traz, além de parte da história da dramaturgia do DNA, uma paixão pela arte teatral como poucas vezes eu presenciei.

Espetáculo: “Com a Pulga Atrás da Orelha” de Georges Feydeau. Direção de Gracindo Junior.

 

 

F.Fachetti – “Oropa, França e Bahia” – autor e roteirista – que foi adaptada para o longa, com direção de Glauber Filho. Conte-nos sobre.

 

DANIEL DIAS DA SILVAQuando ainda morava em Fortaleza, escrevi meu primeiro texto, “Oropa, França e Bahia”, inspirado em um poema de Ascenso Ferreira. Na época, não tinha muito conhecimento de Dramaturgia, escrevi movido pela intuição. Surgiu a possibilidade de inscrever a peça em um projeto do Theatro José de Alencar que tinha supervisão de Luiz Carlos Maciel e do Luiz Carlos Vasconcelos e contaria com vários professores, como Domingos de Oliveira, Aderbal Freire-Filho, Deborah Colker, entre outros.

O objetivo do projeto era o acompanhamento aos artistas desde a escolha de um texto até a montagem final, quando um dos textos inscritos seria escolhido. E, para minha surpresa, “Oropa, França e Bahia” foi o escolhido e foi montado com direção de Nehle Francke. O cineasta Glauber Filho assistiu a peça e me propôs adaptar a história para o audiovisual.

O projeto ganhou um prêmio da Fundação Vitae e resultou em um longa-metragem, foi minha primeira experiência com roteiro audiovisual.

Longa-Metragem adaptado da peça de Daniel dias da Silva: “Oropa, França e Bahia”. Inspirado no poema homônimo de Ascenso Ferreira. O cineasta Glauber Filho adaptou para o audiovisual.

No Longa “Oropa, França e Bahia” – Ana Paula Bouzas como Maria de Alencar. Direção de Glauber Filho que assinou o roteiro junto com Daniel Dias da Silva.

 

 

F.Fachetti – Como se sente na linguagem das telas (cinema e TV)?

Gostaria que nos aclarasse falando dos filmes e sua participação em “Bate Coração” de Glauber filho – onde também é um dos roteiristas.

Sobre o trabalho de Glauber Filho, conte como se processa.

 

DANIEL DIAS DA SILVAAnos depois daquela experiência com “Oropa, França e Bahia”, o Glauber Filhoestava começando a produção do filme “As Mães de Chico Xavier”, que ia dirigir ao lado de Halder Gomes e me convidou para um dos papéis. Foi muito bom poder voltar à minha terra natal e reunir em um mesmo trabalho antigos companheiros que fizeram parte da minha história e amigos que tinha feito após minha mudança para o Rio.

Filme: “As Mães de Chico Xavier” de Glauber Filho. Em cena Daniel Dias da Silva e Herson Capri.

 

Depois de algum tempo, o Glauber Filho decide retomar à temática espírita, mas agora com uma abordagem mais leve. “Bate Coração” nasceu a partir da adaptação de dois textos teatrais de Ronaldo Ciambroni, que assinou o primeiro tratamento do roteiro. Foi aí que o Glauber Filho me convidou para desenvolvermos juntos o roteiro final. Nós mantivemos a ideia central sobre um machão inveterado que tem um problema de saúde e recebe um transplante de coração de uma personagem travesti que morre em um acidente.

Durante cerca de dois anos, nos revezamos na escrita do roteiro, desenvolvendo personagens, cenas, diálogos, etc. Mas não havia ainda a perspectiva de eu atuar no filme. Por essas coincidências da vida, houve uma mudança no elenco poucas semanas antes do início das filmagens e acabei entrando para o elenco, interpretando o guia espiritual que tenta convencer a personagem principal a aceitar a sua morte e ir com ele para o Plano Espiritual. Mais uma vez, conseguimos uma química muito especial no elenco e na equipe, com uma diversidade que, acredito eu, dá um sabor especial para quem assiste. Além disso, o filme aborda de maneira leve assuntos muito importantes, como o respeito à diversidade e a doação de orgãos. Foi uma experiência duplamente prazerosa pra mim.

Filme: “Bate Coração” – Daniel Dias da Silva além de atuar é um dos roteiristas.

Filme: “Bate Coração” – reencontro com o cineasta Glauber Filho.

Filme: “Bate Coração”. Atuando e como um dos roteiristas. Na foto com o ator Aramis Trindade.

 

 

 

 

F.Fachetti — “Desalma”, que você participou recentemente, conte-nos desse trabalho. Qual sua participação?

 

DANIEL DIAS DA SILVANa série “Desalma”, produzida pela Globoplay, eu faço uma participação nas duas temporadas como um professor da fictícia cidade de Brígida, onde vivem descendentes de ucranianos e onde se passa a história. Esse lugar é atormentado por um crime do passado e por estranhos acontecimentos místicos. O meu personagem traz alguns elementos da mitologia e da cultura ucraniana para o elenco jovem, que ajudam a contextualizar os acontecimentos. É uma produção de alto nível que investe no suspense, uma linguagem com a qual estamos pouco acostumados a trabalhar e é muito bom mergulhar nesse universo.

 

F.Fachetti – Na cena teatral, com seu trabalho atoral, destrinche-o nos espetáculos: “Viúva, porém honesta”; “Um Sopro de Vida”, e no infantil: “O Principe Poeira e a Flor da Cor do Coração”.

 

DANIEL DIAS DA SILVA“Viúva, Porém Honesta” foi um dos primeiros trabalhos que fiz como ator. Eu morava em Fortaleza e ainda dava os primeiros passos como ator, quando realizaram uma montagem dessa comédia de Nelson Rodrigues e eu tinha assistido como espectador, conhecia algumas pessoas do elenco.

A peça era montagem final de uma turma do Curso de Arte Dramática da Universidade Federal do Ceará, com direção de Bruno Correia Lima, e fez tanto sucesso que voltou aos palcos e acabei sendo convidado para substituir uma pessoa do elenco.

Espetáculo: “Viúva, porém Honesta” de Nelson Rodrigues. Direção de Bruno Correia Lima. Na foto: Daniel Dias da Silva, Jorge Ritchie, Marrocos Anselmo e Fernando Ferreira.

 

 

Curiosamente, a minha carreira é repleta de substituições. Éramos todos jovens atores, começando a pegar a estrada e tudo era novo, uma farra. Tenho ótimas lembranças dessa época. Depois disso, eu decidi que ia seguir a carreira de teatro e, assim que concluí a Faculdade de Direito, fui fazer o Curso de Arte Dramática.

“Um Sopro de Vida” foi uma proposta do Roberto Bomtempo. Como falei antes, um grande amigo e parceiro. Ele tinha nas mãos uma adaptação assinada por Susana Schild para esse texto da Clarice Lispector, uma viagem pela mente conturbada de um autor que vê a personagemdo seu novo livro (interpretada com um misto de força e doçura pela Míriam Freeland) ganhar vida própria, acabando por dominar completamente os rumos da história.

Não foi fácil adaptar para o palco esse universo interior e complexo que é a marca da Clarice Lispector. Mas foi um processo muito saboroso e de muita sintonia entre todos nós. Num primeiro momento, o Bomtempo assumiu a direção, mas numa segunda temporada, invertemos os papéis e ele vestiu o personagem, enquanto eu assumi a direção.

Espetáculo: “Um Sopro de Vida” de Clarice Lispector. Na cena com Miriam Freeland. Direção de Roberto Bomtempo.

 

 

“O Príncipe Poeira e a Flor da Cor do Coração” marcou o meu retorno a um espetáculo direcionado ao público infantil. E não podia ter sido mais especial. A produção era do Marcelo Nogueira e o texto e direção de Saulo Sisnando, com quem eu já queria trabalhar há muito tempo.

A peça falava de diversidade e respeito às diferenças de uma maneira tão emocionante e poética, que encantava as crianças e fazia chorar até os adultos mais durões. E tive o prazer de encontrar colegas incríveis no processo, tanto no elenco como na equipe de produção, de criação e técnica. É muito bom quando essa energia flui. Tivemos uma temporada maravilhosa no Oi Futuro, com casa lotada quase todos os dias e fomos indicados a vários prêmios.

Infantil: “O Principe Poeira e a Flor da Cor do Coração”. Texto e direção de Saulo Sisnando. Conquistou vários prêmios.

Matéria sobre o infantil “ O Principe Poeira e a Flor da Cor do Coração”.

 

 

 

F.Fachetti – Qual o maior desafio de ter sido diretor de um dos teatros mais opulentos do Rio – Teatro João Caetano – e o que esse cargo te agregou como pessoa e artista da cena?

 

DANIEL DIAS DA SILVAQuando recebi o convite, feito pela então Presidente da FUNARJ, Eva Dóris, confesso que tive muito receio. É uma casa histórica, uma das maiores e mais tradicionais casas de espetáculo do país. E, claro, como um teatro público, tinha diversos problemas estruturais e limitações. Mas, foi fundamental o apoio que recebi da FUNARJ e da equipe da Secretaria de Estado de Cultura, que na época tinha a Adriana Rattes à frente, na solução dos problemas que iam surgindo. Eles queriam justamente alguém que, como eu, não tivesse preso à rotina da burocracia, mas que circulasse e pudesse manter um diálogo entre as produções, as equipes técnicas dos espetáculos e do teatro, que entendesse as demandas do processo criativo e tentasse, na medida do possível, atender a elas, apontar soluções.

Não era nada fácil, a função me exigia atenção e dedicacão total, mas pude contar com uma equipe de funcionários guerreiros, verdadeiros heróis, que aceitaram o desafio de construir uma nova filosofia de trabalho, mais colaborativa, mais agregadora.

Os problemas sempre vão existir, mas é importante você conquistar a confiança e o respeito da sua equipe, dos seus parceiros e trabalharmos juntos. Sem esquecer a relação com o público, que exige um cuidado extra, ainda mais quando se trata de um espaço do Estado. Foram sete anos de muito trabalho, mas também muito aprendizado e que levo comigo para sempre.

Infelizmente, estava difícil conciliar o trabalho como gestor e a minha carreira artística e tive que optar, mas saí feliz e com sentimento que fiz o meu melhor. E fiz grandes amigos, que levo até hoje.

Daniel Dias da Silva com os colegas administradores do Teatro João Caetano.

 

 

 

F.FachettiTorne conhecido, como um dos criadores, a Lunática Cia. de Teatro, produzindo para a cena: “Matador”,“Esse Vazio”, “O Cego e o Louco” e “O Princípio de Arquimedes” – trabalhos de projeção no cenário teatral.

 

DANIEL DIAS DA SILVAComo ator e diretor, sentia o desejo e a necessidade de realizar certos trabalhos, queria me aventurar em certos temas, certos textos, mas sempre esbarrava na questão da produção. Por isso, me juntei ao ator Gustavo Falcão, que tem uma trajetória parecida com a minha e decidimos montar nossa produtora, a princípio sem grandes pretensões, apenas viabilizar certas questões burocráticas da nossa carreira.

Mas daí surgiu a ideia de inscrever projetos nossos e, depois de trocarmos ideias, decidimos pelo texto “Matador” (título original “Mirando al Tendido”, do autor venezuelano Rodolfo Santana, que eu havia traduzido). Um texto lindo e poético que mostra um diálogo entre um touro e um toureiro, que fala sobre vida, morte, a importância da arte no mundo de hoje.

Espetáculo: “O Matador”. Direção: Herson Capri e Suzana Garcia. Ao lado de Gustavo Falcão e Danilo Gomes. Primeira produção da Lunática Cia de Teatro. Foto: Daniel Nader.

 

Para a direção,convidamos o Herson Capri (com quem já havia trabalhado no cinema e no teatro) e a Susana Garcia, sua mulher e parceira de direção. Na época, conseguimos um patrocínio que permitiu realizar o espetáculo e, de repente, lá estávamos nós sendo empurrados para a produção, tendo que lidar com documentos, planilhas, planejamentos, escolha de equipe, pagamentos, direitos, negociações, contrapartidas, cronogramas, ao mesmo tempo que tínhamos que ensaiar, decorar texto, tomar decisões sobre cenário, figurino, material gráfico.

 

“O Matador” – de Rodolfo Santana. Direção Herson Capri e Suzana Garcia.

 

Optamos estrear a peça viajando, Recife e Fortaleza e só depois vir para o Rio, uma loucura. E ainda tivemos que encarar o fechamento dos teatros da prefeitura, na época do incêndio da Boate Kiss, por que eles precisavam se adaptar às regras de segurança, o que gerou a suspensão da nossa segunda temporada. Só voltaríamos alguns meses depois e com um prejuízo. Mas tudo isso nos trouxe muita experiência e maturidade para lidar com essas adversidades e a peça teve uma trajetória linda.

Depois disso, começamos a pensar novos projetos e me lembrei de um texto argentino, que um amigo me havia sugerido:“Un Hueco”, de Juan Pablo Goméz, fez grande sucesso na Argentina e mostrava três amigos de infância, enclausurados no vestiário de um clube decadente em uma cidadezinha do interior, enquanto do lado de fora, está sendo velado um amigo em comum. Contactamos o autor, eu assinei mais uma vez a tradução e a adaptação da peça, que chamamos aqui “Esse Vazio”.

Nos apaixonamos pelo texto e convidamos o Sergio Módena, que aceitou dirigir. O Sávio Moll se juntou ao grupo e, em um certo momento, comentei com o Gustavo: “nós temos uma companhia!”, afinal temos um grupo de profissionais e artistas que fazem parte desse núcleo, temos elementos em comum nos textos que estamos trabalhando, como o fato de buscarmos textos inéditos de autores contemporâneos que tentam refletir sobre o mundo atual e sociedade em que vivemos, abordando temas comuns, como a construção de um ser social, a comunicação, a solidão. Foi então que decidimos seguir nesse caminho.

Espetáculo: ”Esse Vazio” do argentino Juan Pablo Gósmez. Segundo trabalho da Lunática Cia de Teatro. Direção: Sergio Módena. Foto: Ricardo Brajterman.

 

Nosso trabalho seguinte foi o espetáculo “O Princípio de Arquimedes”, do autor catalão Josep Maria Miró.

A peça vinha de sucessivas montagens pelo mundo, arrebatando prêmios e críticas sempre positivas. Não tive dúvidas e comprei os direitos da peça, mas, dessa vez, assumi a posição de diretor (além de produzir) e reuni um elenco dos sonhos.

Conseguimos apoio do Sesc e posteriormente seguimos para o Centro Cultural Correios, com um imenso sucesso. Ainda queremos voltar com a peça, em um formato mais simplificado, para podermos viajar. A peça toma como ponto de partida um suposto beijo que um professor de natação teria dado em um de seus alunos para tratar do risco do julgamento antecipado das redes sociais e mostrar que a verdade pode ser composta de diferentes pontos de vista. Ele também questiona que mundo queremos deixar para os nossos jovens, onde um gesto de carinho pode levar uma sociedade inteira ao pânico coletivo.

Espetáculo: “O Princípio de Arquimedes” de Josep Maria Miró. Direção: Daniel dias da Silva. Realização da Lunática Cia de Teatro. Na foto Helena Varvaki ne Sávio Moll. Crédito: Daniel Dias da Silva.

“O Princípio de Arquimedes”. Em cena Gustavo Wabner, Cirillo Luna e Helena Varvaki. Direção: Daniel Dias da Silva.

 

Nosso último trabalho foi “O Cego e o Louco”, de Claudia Barral, que sempre desejei montar, desde a primeira vez que li.

Espetáculo: “O Cego e o Louco” de Claudia Barral. Lunática Cia de Teatro. Direção: Gustavo Wabner.

 

Uma peróla da dramaturgia! Dessa vez, fui para o palco, ao lado do Alexandre Lino (outro parceiro maravilhoso, com quem já tinha trabalhado em alguns infantis) e convidamos o Gustavo Wabner, que vinha de diversos trabalhos como Diretor Assistente e tinha acabado de assinar a direção de uma elogiada montagem de “Navalha na Carne” e aceitou o convite.

“O Cego e o Louco” de Claudia Barral. Em cena Daniel Dias da Silva e Alexandre Lino. Direção: Gustavo Wabner.

 

“O Cego e o Louco” mostra o cotidiano de dois irmãos solitários, cuja relação começa a desmoronar com a possiblidade da visita de uma nova vizinha, abordando de forma poética e muito sensível sobre o medo, a loucura em que nos aprisionamos na vida. A peça fez temporada no Sesc com sessões lotadas, mas estamos estudando a possibilidade de voltarmos, quando as condições assim permitirem.

“O Cego e o Louco”.

Equipe reunida de “O Cego e o Louco”.

 

Enquanto isso, já estamos trabalhando em um novo projeto e também estou dedicado a dois espetáculos, que estou dirigindo de forma remota: uma peça online, de Saulo Sisnando, com o grupo Teatro de Apartamento e uma peça presencial, de autoria de Herton Gustavo Grato, que deve estrear no segundo semestre em Lisboa.

 

Outros trabalhos cênicos efetivados:

 

Como Autor, Daniel Dias da Silva escreveu vários textos, como essa montagem acima: “A Terra é Azul” – dirigida por Tadeu Aguiar. Em cena: Eduardo Bakr e Vitor Thiré.

Como diretor, Daniel Dias da Silva, conduziu o monólogo com Samir Murad:

“Cícero – A Anarquia de um Corpo Santo”

Direção de Daniel Dias da Silva: “Acabou o Pó” de Daniel Porto. Com: Celso André e Anderson Cunha.

Espetáculo de formatura: “Jacques e seu Amo” de Milan Kundera. Em cena com Paulo Ess. Direção de Bruno Correia.

Primeiro trabalho no cinema de Daniel Dias: “Eu Não Conhecia Tururu” de Florinda Bolkan.

Na Novela: “Êta, Mundo bom” ao lado de Isabela Garcia.

Na Novela: “Alto Astral”. Com: Thiago Lacerda.

Na Novela: “Verão 90” com Jesuíta Barbosa.

 

Daniel Dias da Silva.

 

 

O UNIVERSO TEATRAL NOS PRESENTEIA NO PALCO DO BLOG/SITE, na próxima quarta, 04/8, com a equidade cênica de um dos mais respeitados atores que conheço – acompanhando muito seu aurífero trabalho como espectador, artista e crítico teatral – na caixa preta dos teatros, tv e cinema.

Uma honra desencantar aqui alguns pormenores de uma carreira das mais potentes nas artes dramáticas:

O ATOR:

MARCELLO ESCOREL.

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