– RETROSPECTIVA: Antonio Gonzalez – Ator e Diretor. Por Francis Fachetti.

 

Temporada 2022 – Blog/Site:

 

“RETROSPECTIVA”

Projeto:

“Entrevistas NECESSÁRIAS”

 

O Blog/Site iniciou a temporada de retrospectiva das inúmeras (78) homenagens feitas aos artistas das artes cênicas em geral – teatro, dança, cinema…

 

Antonio Gonzalez – Ator e Diretor.

Antonio Gonzalez em cena numa sublime e necessária construção de um personagem: Boris Alekseievitch – no espetáculo “GAIVOTAS” – que está em cartaz no Teatro Poeirinha, até 31/7, corram! NECESSÁRIO!

De Matéi Visniec. Direção: Fernando Philbert.

 

Gaivotas

 

O Blog/Site volta ao universo teatral e midiático (cinema e tv), numa trajetória perspicaz, harmoniosa, significativa; marcando época com seus trabalhos e sua presença serena, traquejada e erudita.

Através de uma leitura dramática, com um dos textos de Nelson Rodrigues – “O Beijo no Asfalto” – que ele dirigiu, e eu participei como ator, tive uma convivência estreita com sua direção e constatei sua competência e serenidade.

Possui uma formação com célebres do cenário teatral: Luis de Lima, Celso Nunes, João das Neves, Aderbal Freire, Domingos Oliveira, dentre outros, trilhando os surpreendentes caminhos das telas e do palco.

Domina o vocabulário de três línguas: inglês, espanhol e alemão.

Essa figura cênica necessária e conhecedora do seu ofício chama-se:

Antonio Gonzalez – Ator e Diretor.

 

 

ABAIXO UMA PEQUENA ATUALIZAÇÃO DOS RECENTES TRABALHOS EFETIVADOS POR ESSE ATOR E DIRETOR E A SEGUIR SUA:

RETROSPECTIVA

DO PROJETO: “ENTREVISTAS NECESSÁRIAS”, INSERIDO NESSE BLOG/SITE, REALIZADO A 01 ANO E MEIO ATRÁS.

 

 

 

Meus últimos trabalhos:

 

– “Em 2021 fiz a novela Gênesis, na Record. Era um personagem pequeno, o Alom, mas que tinha um conflito com a filha – que fugiu para casar com um homem de uma outra tribo e ficou 15 anos sem dar notícias – ela volta, pede perdão ao pai, mas ele demora a perdoar a filha, o que rendeu algumas cenas emocionantes”.

Com Gustavo Machado e Jandir Ferrari na novela “Gênesis”.

 

“Depois fiz um episódio no Multishow – “Central de Bicos” – com Marisa Orth, Rosane Gofman, Babú Santana, Maurício Manfrini, Gilray Coutinho e Evaldo Macarrão. Eu fazia um turista argentino, o Juan, que era enrolado pelos personagens do Babú e do Maurício”.

“Depois, apareceu o Wilton Franco, no filme “Mussum o Filmis”, protagonizado pelo Ailton Graça e dirigido pelo Silvio Guindane. Em plena pandemia, filmávamos com muitos cuidados e testes diários de Covid”.

Com Ailton Graça no filme “Mussum, O Filmis”.

Personagem Wilton Franco, no filme: “Mussum, O Filmis”.

 

  

“Ao mesmo tempo estava trabalhando como coordenador do núcleo de preparadores de elenco da Record, na novela “Reis” – essa foi outra experiência muito rica, poder acompanhar de fora, o desenvolvimento de uma relação ator/personagem”.

 

“Agora estou, ao lado da Bibiana Rozenbaum e do Sávio Moll, atuando na peça, “Gaivotas”, de Matéi Visniec, com direção do Fernando Philbert, no teatro Poeirinha. Uma montagem instigante, atual e necessária, em que o Fernando adaptou o texto – um “drama” que se passa na Rússia do começo do século passado, de uma maneira que reflete muito bem o que vivemos no Brasil dos dias de hoje”.

De Matéi Visniec. Direção: Fernando Philbert.

ATÉ 31/7.

Boris Alekseievitck, em “GAIVOTAS”.

Bibiana Rozenbaum(Nina), Sávio Moll (Konstantin) e Boris em:

“GAIVOTAS”.

Direção: Fernando Philbert.

 

 

Segue uma pequena crítica que resenhei na estreia de “GAIVOTAS”:



#EspetaculoNECESSARIO:

 

Sucinto comentário crítico do espetáculo:
“GAIVOTAS”
( Da obra de Matéi Visniec)

 

No Teatro Poeirinha, está em cartaz mais um texto obra-prima do romeno de escrita necessária: Matéi Visniec.
Elenco, direção e técnicos fazem da obra um desafiador momento teatral de pura conexão com o que pode ser de mais teatral e inefável – teatro na veia com talento e vocação – um galardão de luz em impactante e comovente cenário cultural.
Em interpretações de delicadeza em amálgama com vigor cênico na medida, e de extremo necessário dos atores: @antoniogonzalez, @bibianarozenbaum e @saviomoll.
Destaco aqui a presença de Antonio Perez Gonzalez que aparou as arestas de seu personagem em costura com fios de ouro – nos dando um intérprete maduro e íntimo da cena – Bravo!!!
A direção de Fernando Philbert é cirúrgica e nevrálgica.
Equipe técnica no compasso assertivo para nos oferecer mais que um prazeroso espetáculo, em detalhada e aparente entrega.
Vilmar Olos em iluminação que ascende, faz transbordar as interpretações.
Uma cena teatral coesa, brilhante, necessária, colocando o teatro no lugar que merecemos estar: Na mais intensa reflexão, evidenciando que cultura salva vidas.
Um Espetáculo NECESSÁRIO e com urgência de se presenciar.

Por Francis Fachetti – Ator, bailarino, coreógrafo, dançarino de flamenco, diretor de movimento e crítico teatral e de dança do Blog/Site:
WWW.ESPETACULONECESSARIO.COM.BR

 

 

 

 

 

Entrando na RETROSPECTIVA da

– Entrevista NECESSÁRIA – com:

 Antonio Gonzalez.

 

 

F.Fachetti – Na TV, com os trabalhos que você realizou, o que destacaria de relevante para a teledramaturgia, que tenha uma conexão agregadora com uma reflexão sócio-cultural? Quais seriam essas novelas, e porquê?

 

Antonio Gonzalez – Destaco Pantanal. Além de ser uma novela muito bacana de fazer, como linguagem inovou bastante.

Gravada em grande parte no Pantanal mesmo, produziu imagens bonitas, longas, que nos davam tempo de entrar no ambiente e lugar em que acontecia a história. Fiz o Bruno, um capanga contratado para matar a Maria Marruá, mulher onça, personagem central na trama – por trazer um Brasil arcaico, místico, interpretada pela Cassia Kiss.

A cena de nossa luta e sua morte foi muito bonita, muito bem gravada. Eu disse pra Cássia: Só não vale acertar meu saco, de resto pode vir para cima de mim. E ela veio, como uma onça mesmo, ficou bem forte a cena.

Essa coisa de gravar no local onde a história acontece mesmo, no meio do Pantanal, no caso, é muito legal. Você tem uma porção de gente à sua volta, câmeras, booms de microfone, rebatedores, mas você está lá, no meio do mato, dentro do ambiente onde acontece a história.

Claro que no teatro o ator entra em cena e diz: “Anoitece no Peloponeso!”, e ele está lá, de noite, no Peloponeso. A plateia acredita nele e um vai fazendo companhia ao outro, cúmplices, e assim essa “verdade”, se confirma/estabelece.

Mas em TV é outra coisa. Gravar lá no Pantanal foi muito intenso, depois de fazer a cena eu passei mal, vomitei, fiquei sem forças por um tempo.

 

Outra novela que fiz e que também trouxe esse Brasil profundo, das matas e seus mitos, foi Amazônia.

No início foi parecido, pois gravamos muito nos arredores de Manaus. Eu fazia o cacique de uma tribo de povos indígenas, de nome Kria. Passei uns dez dias imerso numa Tribo do Xingu (novela se passava na Amazônia, mas, a tribo que conseguiram pra gente conhecer foi no Xingu), cujo cacique era Aritana, para conviver e aprender um pouco sobre os costumes deles.

Vivi muitas histórias interessantes nessa experiência, mas o que me chamou muito a atenção é que eles falam português como estrangeiros. Claro, português é, de fato, uma língua estrangeira para eles. Foquei muito nisso, no jeito deles falarem, em como seu corpo e sua voz revelavam outra brasilidade. Acho que consegui fazer um bom trabalho.

 

Bastidores de “Amazônia”.

 

 

F.Fachetti – Quais dos seus trabalhos em cinema te proporcionou mais desafios, e consequentemente um aprendizado mais aprimorado nessa linguagem? Cite apenas dois deles, e discorra sobre.

 

Antonio Gonzalez – No filme ”Tiradentes”, dirigido pelo Oswaldo Caldeira, eu fiz o Aleijadinho e passei por um desafio interessante.

Numa cena com o Humberto Martins, que fazia o Tiradentes, eu entrava em cena em cima de uma mula. Gravamos o geral, uns contra planos e depois os takes fechados.

A mula se comportou muito bem, mas na hora de filmar ao meu lado ela empacou. Não houve quem fizesse a mula sair do lugar. Dei a ideia de fazer sem a mula, era um plano fechado, então eu andei simulando o molejo da mula com o corpo e rodamos a cena. Foi um sucesso, todo mundo gostou, riu-se muito, mas, como acontece tantas vezes no cinema, a cena acabou sendo refilmada depois, e não foi essa versão que permaneceu no filme.

“Jorge da Capadócia”, dirigido por Alexandre Machafer, foi filmado no Rio de Janeiro e na Turquia, e conta a história de Jorge da Capadócia, nosso São Jorge. Filmar na Capadócia foi parecido com filmar no Pantanal ou na Amazônia, por estar no lugar onde a história acontece, isso passa uma energia incrível para gente.

 

Filme: “JORGE DA CAPADÓCIA” – Direção de Alexandre Machafer.

 

 

F.Fachetti – Dentre seus Mestres que você citou – Luis de Lima, Celso Nunes, João das Neves, Aderbal Freire Filho e Domingos Oliveira. Para você, qual ponto nevrálgico, determinante, que cada um possui, que pode mudar o olhar e a experiência de um ator?

 

Antonio Gonzalez – Fiz um curso de mímica com o Luis de Lima, e foi incrível estudar como a precisão do gesto e do movimento tornam visível o invisível. Não me dediquei à mímica, mas esse curso mudou minha forma de ver a relação do corpo com a interpretação. A partir daí comecei a me preocupar com o gestual dos personagens. Todos eles gesticulam da mesma maneira? Eu sou destro, mas será que algum personagem não poderia ser canhoto, ter o impulso, sempre, de fazer as coisas com a mão esquerda? Eu sei, eu me faço essa pergunta também, se isso tem alguma relevância para o todo da obra, talvez muito pouca relevância, mas são essas pequenas particularidades que ajudam a construir um personagem mais rico, consistente, crível.

 

Luis de Lima.

 

Gosto muito do trabalho do Aderbal Freire Filho, e tive a oportunidade de trabalhar com ele algumas vezes no teatro.

Numa leitura de “Rei Lear”, na época do Centro de Demolição e Construção do Espetáculo; em “Soroco, sua Mãe e sua Filha”, um espetáculo que ele dirigiu na Holanda com o Grupo Munganga, do Carlos Lagoeiro e da Claudia Maoli, que vieram ao Brasil para algumas temporadas, nas quais eu me inseri; em “Tiradentes”, em “No Verão de 96” e em “Vianinha Conta o Último Combate do Homem Comum”.

Em todos esses espetáculos ele me orientava, problematizava minhas escolhas e me ajudava a aprimorar a maneira de dizer o texto, me mostrando diferentes lógicas nas motivações dos personagens.

 

“No verão de 96” – texto e direção: Aderbal Freire Filho.

 

Aderbal Freire Filho.

 

 

 

Foto: Encontro no Centro de Demolição e Construção do Espetáculo.

 

 

Outro mestre foi meu pai – Eladio Perez Gonzalez, que foi um grande professor de canto e de técnica vocal.

Trabalhei, fiz aulas com ele à minha vida toda, pois, desde pequeno, eu observava como ele estudava e trabalhava à sua voz. Um cara extremamente disciplinado. Depois, já como ator, sempre tive ele ao meu lado me orientando.

Com ele aprendi a ver a voz como uma matéria prima, uma parte do meu corpo. Passei a ter a noção de que a voz é física, que precisa de cuidado e exercício constante, de dedicação e trabalho.

Aprendi que tipo de trabalho eu teria que fazer para usar a voz como eu estava querendo usar – e, já que eu estava querendo usar a voz desse jeito, poderia trabalhar assim ou assado. Isso, do ponto de vista puramente vocal, me refiro à intensidade, à altura, à cor do som que sai de minha boca, sem mexer diretamente na interpretação, mas na qualidade da voz.

Barítono Eladio Pérez González.

 

 

F.Fachetti – Gostaria que você falasse um pouco sobre cada um dos espetáculos abaixo. O que foi crucial, essencial, para seus feitos como ator nessas obras?

 “O Mercador de Veneza” de W. Shakespeare; “O Avarento” de Moliére; “O último lutador” de Marcos Nauer; “Vianinha conta o último combate do homem comum” de Oduvaldo Vianna Filho e “A Peça do casamento” de Edward Albee.

 

Antonio Gonzalez – Nos anos 90, eu estava trabalhando com a CIA Limite 151, já tínhamos montado a “Comédia dos Erros” de Shakespeare, com direção do Claudio Torres Gonzaga e começamos a montar “O Mercador de Veneza”, também de Shakespeare, e também com direção do Claudio.

“O Mercador…” contava com grande parte do elenco da “Comédia…”, mas o papel que caberia a mim, o mercador Antonio, pareceu-me “mais do mesmo”. Vou explicar: quando jovem eu era bonitinho, fazia muito papel de mocinho, de galã, era comum me procurarem para esse tipo de personagem. Como ainda não tinham um ator para fazer o bufão Lancelot Gobbo, um criado de Shylock, personagem central dessa trama – interpretado lindamente por Edney Giovenazzi – resolvi encarar o desafio e me oferecer para fazer esse personagem. Não foi fácil para mim, essa quebra de paradigma, e eu ainda tinha na pele do “Gobbo”, o compromisso de ser engraçado.

Entrei numa crise; me lembro de um dia ter faltado em um ensaio porque não estava conseguindo resolver o personagem, estava bloqueado, em pânico. Mas valeu a perseverança, superei os bloqueios e o que estava me apavorando se mostrou como um impulso para um salto.

Fiquei muito satisfeito com o resultado (minha mãe também adorou, hahaha). É um dos trabalhos dos quais mais me orgulho.

“Mercador de Veneza” de William Shakespeare. Direção: Claudio Torres Gonzaga. Antonio Gonzalez e Heleno Prestes.

 

 

Em “O Avarento”, dirigida por João Bethencourt, e com Jorge Dória como protagonista, eu substituí o Bruno Garcia no papel do Valério, fiel criado do personagem título, e namorado de sua filha.

É um texto clássico, mas, nas mãos do Dória, virou uma comédia rasgada. A direção do João era muito divertida, mas o Dória colocava muitos cacos, poucos fora do contexto, todos muito engraçados.

Algumas pessoas me diziam ter se decepcionado pois tinham ido assistir a um Molière. Eu lhes dizia que não, eles tinham ido assistir a Jorge Dória.

Ele ficava quase o tempo todo em cena e no último ato, quando todos os quiproquós se resolvem, ele já estava bastante cansado. Às vezes, puxava um banquinho do cenário, se sentava no meio do palco e me dizia baixinho, “daqui eu não saio, vou fazer tudo daqui”.

“O Avarento” com Jorge Dória.

 

 

De 2002 a 2015 eu trabalhei na Multirio (um canal de Tv da prefeitura do Rio) e na Rede Record, inicialmente como assistente de direção e depois como diretor. Uma experiência muito enriquecedora em minha vida profissional e na minha forma de ver a cena. Um novo ponto de vista. Foram 14 anos longe dos palcos e O ”Último Lutador” foi um recomeço na carreira de ator e no contato com o teatro.

A peça mostrava uma família de lutadores de vale-tudo, suas crises e dramas.

A preparação foi muito importante nessa montagem, tivemos o privilégio de contar com o instrutor de lutas Milton Vieira, que nos possibilitou uma imersão naquele universo. A peça terminava com uma luta coreografada por ele e muito bem executada pelo Daniel Villas e Marcos Nauer. Quem assistia achava que eles saíam na porrada mesmo. Eu fazia um ex-lutador, filho do personagem de Stenio Garcia e pai dos personagens de Daniel e Marcos.

Um homem maduro, sofrido, viciado em drogas e álcool, que tinha abandonado tudo para virar pastor evangélico, buscando salvação. Seus dois filhos, ambos lutadores, tinham relações complicadas com ele. Na trama, ele passava a treinar um deles para um torneio de MMA.  Trabalhar o equilíbrio entre a calma e resignação de um religioso e a agressividade de um treinador de lutas foi um desafio estimulante para mim. A direção dinâmica e sensível do Sergio Módena foi muito motivadora também.

 

“O Último Lutador” de Marcos Nauer e Tereza Frota. Direção: Sérgio Módena. Com: Daniel Villas, Gláucio Gomes, Stênio Garcia, Marcos Nauer e Antonio Gonzalez.

“O Último Lutador”

 

Em “Vianinha Conta o último combate do homem comum” de Oduvaldo Vianna Filho, direção do Aderbal Freire Filho, eu substituí dois atores. O Rogério Freitas, que já vinha substituindo o Candido Damm, e o Alexandre Davi, que também já vinha substituindo o Isio Ghelman.

Eu entrei no espetáculo durante uma pequena turnê pelo estado Rio. A princípio, me chamaram para substituir o Rogério, mas algumas semanas antes da turnê, já com o personagem ensaiado e pronto para estrear, a Ana Velloso, produtora da peça ao lado da Vera Novello, me ligou dizendo que o Alexandre não poderia participar do início da turnê, me perguntando se eu poderia fazer também o personagem dele.

A peça conta a história de um casal idoso, pais de 5 filhos, que, devido à sua precária condição financeira, têm que morar com os filhos, separados. Ele, com o filho mais velho, e ela, com a caçula. O Rogerio fazia o pai e o Alexandre, o filho mais velho. O Rogerio podia fazer o início da turnê, então, eu fazia o filho. Depois, o Alexandre Davi chegou para fazer o filho e eu passei a fazer o pai, no lugar do Rogério. Enfim, foram três semanas decorando textos de dois personagens ao mesmo tempo, com a ajuda do vídeo da peça, uma verdadeira loucura.

Foi uma experiência muito rica e gratificante. Era uma montagem muito bonita.

 

 

“A Peça do Casamento”, de Edward Albee, estreou em 2018 em Belo Horizonte.

Uma produção caprichadíssima da Quintal Produções, com direção do Guilherme Weber, e Eliane Giardini e eu dividindo o palco, aliás, trabalhar com ela foi muito bom. Uma grande atriz, uma leoa em cena, de uma generosidade incrível.

Todos os dias de espetáculo, a gente chegava mais cedo e passava o texto todo da peça no camarim. Parceira mesmo. A peça conta a história de um casal casado há 30 anos, e em um belo dia o marido chega em casa e diz para esposa que a está abandonando. Começa aí uma lavação de roupa suja em que os dois revelam segredos dolorosos, reviram suas vidas de cabeça para baixo, se agridem violentamente, chegando às vias de fato (a rubrica pede sangue e chegamos a ensaiar com cápsulas de sangue artificial na boca) – numa pancadaria muito bem coreografada pelo Toni Rodrigues. Trabalhar com o Guilherme Weber foi muito estimulante, pois havia dias em que ele me avisava: “hoje vai ser ensaio massacre!” E parava o ensaio a cada frase minha, pedindo para repetir as falas sem os vícios e muletas com as quais eu estava acostumado – foi puxado, mas me fez um bem danado. Outro fato interessante foi que fizemos a peça de 2018 a 2020, em BH, em Porto Alegre, em São Paulo e no Rio, mas não ininterruptamente, o que me possibilitava um tempo de amadurecimento e melhor compreensão do personagem e da cena a cada parada.

Estávamos muito afiados, eu e Eliane, a peça vinha crescendo muito. Todos nós muito animados e satisfeitos.

Em BH, Porto Alegre e São Paulo tivemos casa lotada.

Em março de 2020 começamos uma temporada que seria de dois meses no Teatro Poeira, onde ensaiamos a peça, mas com a pandemia a temporada foi interrompida. 

 

“A Peça do Casamento”. Com: Eliane Giardini e Antonio Gonzalez. Direção: Guilherme Weber.

 

Antonio Gonzalez em: “A Peça do Casamento”.

 

 

 

 

F.Fachetti – No começo de minha carreira, fiz um espetáculo com texto de Qorpo Santo – autor gaúcho, do Teatro do Absurdo – pouco conhecido – até mesmo pela classe artística. Foi a primeira vez que subi num palco: Teatro Municipal de Vitória, ES.

Fale para nós sobre esse espetáculo desse dramaturgo tão invisível na nossa literatura cênica – que você atuou, e o que você sabe sobre Qorpo Santo?

 

Antonio Gonzalez – “Qorpo Santo: A Impossibilidade da Santificação” foi o espetáculo de formatura de um grupo de alunos que entrou para UniRio em 1980. Passamos 4 anos estudando e fazendo teatro juntos.

Fiz uma escola de teatro fantástica, entrei em 1980, a Unirio ainda era na praia do Flamengo, 132, antiga sede da Une.

Com apenas uma semana de aula fomos expulsos, pela polícia, sob a alegação de que o prédio podia cair, ou de que a Une queria retomar o prédio. Duas mentiras. Aliás, um grupo de alunos dessa época (Glaucia Rodrigues, Helder Carneiro, Lucila Bourepere Peixoto, Nedira Campos, Vania Leimig e eu), vem fazendo um documentário sobre essa expulsão, porque quase ninguém sabe que lá, naquele prédio, de 1965 a 20 de março de 1980 funcionava uma escola de teatro.

O documentário se chama “A Gente Estava Lá” e estamos em fase de captação de recursos. Voltando à escola, foi um período muito feliz da minha vida. Eu entrava ao meio dia e era “posto para fora” pelo Eurídice, vigia noturno da escola.

Tive, como professores, Yan Michalski, Bárbara Heliodora, Pernambuco de Oliveira, Marie Louise Nery, Roberto de Cleto e muitos outros nomes ilustres do meio teatral brasileiro. Acredito que estudo, pesquisa e prática, são fundamentais na formação do ator. E àquela escola concentrava essas três frentes.

José Joaquim de Campos Leão – “Qorpo Santo”, foi um professor, um homem de teatro, um visionário, precursor do Teatro do Absurdo, um louco, ou tudo isso junto?

O professor e autor gaúcho teve uma vida atribulada e foi considerado, por uma junta médica, portador de mal sem remédio – a monomania. Escreveu pelo menos 16 textos teatrais. Mergulhar nas suas peças e conversar com as questões que delas emergem é uma experiência muito rica. Foi isso que fizemos, eu, Almir Martins, Cristina Montenegro, Glaucia Rodrigues e Gustavo Otonni, em “Qorpo Santo: A Impossibilidade da Santificação”, uma coletânea de peças do autor gaúcho – que foi o espetáculo de formatura na escola, tanto do elenco, como do diretor, Marcelo de Barreto, e do cenógrafo, Eduardo Tudella.

Tenho muito orgulho desse trabalho, resultado de uma integração profunda de uma galera que passou 4 anos estudando e fazendo teatro junto. Fizemos uma curta temporada na própria escola, uma temporada no Teatro Cacilda Becker, outra na Aliança Francesa da Tijuca e ainda uma viagem pelas regiões sul e sudeste do país.

Com patrocínio do Inacen e da Aliança Francesa excursionamos por 12 cidades, de Rio Grande, RS a São Paulo. Nossa integração, como elenco, era tão afinada, que fazíamos de tudo na turnê. Adaptávamos, inclusive, o espetáculo para cada novo teatro.

Na montagem na Unirio, tínhamos uma certa produção, bancada pela escola e um cenário com estruturas de metal que eu, Gustavo e Almir montamos em 3 dias. Na viagem, foi impossível transportar o cenário original, encomendamos, então, à Colônia de pescadores do Posto 6, em Copacabana, uma rede de cordas trançadas, enorme, que pendurávamos na boca de cena, na qual podíamos nos pendurar ou subir, ou ainda pendurar no fundo do palco, quando isso não era possível.

Em Porto Alegre chumbamos a rede de um lado a outro em cima da plateia. Fazíamos cenas ali em cima.

Cada situação era um desafio e tínhamos que reinventar nosso cenário, estrutura e relação cênica com o espaço. Bacana, foi em Bagé, onde havia um piano de cauda no palco. Uns dois anos antes de nossa montagem, houve uma reforma no teatro, e a passagem por onde entrara o piano no palco havia sido fechada, sei lá por quê. O piano, portanto, não podia ser retirado do palco, e teve que ser incorporado ao cenário.

Qorpo Santo passou a tocar piano em algumas cenas e a coisa funcionou tão bem que em Rio Grande, algumas cidades depois, havia um piano no teatro também, esse na coxia, e nós o colocamos em cena, continuando o jogo cênico iniciado em Bagé.

“Qorpo Santo: A Impossobilidade da Santificação”, de Qorpo Santo. Direção: Marcelo de Barreto. Na foto: Glaucia Rodrigues, Cristina Montenegro e Antonio Gonzalez.

“Qorpo Santo: A Impossibilidade da Santificação” – peça de formatura da Unirio.

Antonio Gonzalez em: “Qorpo Santo: A Impossibilidade da Santificação”.

 

 

F. Fachetti – Qual texto literário que você gostaria de levar a cena teatral, e por quê? Existe algum personagem que almeja muito interpretar no teatro?

 

 

Antonio Gonzalez – Sempre gostei dos vilões, dos antagonistas, dos conflitos internos desse tipo de personagem.  Geralmente são extremamente inteligentes, mas alguma coisa aconteceu no passado deles que desperta um desejo de vingança ou reparação, uma atração pelo “caminho das sombras”.

Quando era mais jovem gostaria de ter feito o Iago em “Otelo”, de Shakespeare, ou o Patrício em “Toda Nudez Será Castigada”, de Nelson Rodrigues.

Hoje, nesses dias malucos e incertos que estamos vivendo, tenho lido muito Rubem Fonseca, Sergio Sant’Anna, Edgar Keret (um escritor israelense muito bacana), e percebo nas obras deles um descompasso muito grande entre o indivíduo e o corpo social.

Estou fazendo uma adaptação de um conto/crônica do Charles Bukowski (Declínio e Queda) em que um cara passa a achar natural a violência que o cerca, e passa a agir de maneira desconcertante.

Pretendo levar esse texto à cena, como ator, em breve. Esse é um projeto autoral.

Essas narrativas distópicas têm me impressionado bastante. Textos que mostram a violência como uma coisa normalizada, naturalizada, justamente para nos fazer sentir, diante do impacto causado, que isto não pode ser normal. Gosto desse caminho pela obscuridade, pelo lado feio, cru, mas, também verdadeiro das coisas.

 

 

Graduado pela UNI-RIO em 1983(Bacharel em Artes Cênicas)

Formação com: Luis de Lima; Celso Nunes; João das Neves; Aderbal Freire Filho , Domingos Oliveira e outros.

Curso de roteiro para cinema com José Louzeiro e Marco Schiavon.

Linguas: inglês; espanhol e alemão.

 

Leitura Dramática interpretada, feita no Gabinete Guilherme Araújo, do texto “ O Beijo no Asfalto”, direção de Antonio Gonzalez. Participei como ator, junto com o grupo do Gabinete Guilheme Araújo e com outros atores presentes na foto.

Interessante e necessário relatar, que foram feitas 17 leituras dramáticas, muitas encenadas, cada uma com um nome relevante do cenário teatral na direção, no Gabinete de Leitura Guilherme Araújo, Ipanema.

Eu participei de dez, dessas 17 leituras – uma experiência marcante, de rica pesquisa, nas obras de Nelson Rodrigues, com coordenação da atriz Rose Abdaala.

 

 

“Mais que Imperfeito” de Marcelo Rubens Paiva. Direção: Rafael Ponzi. Foto: Ingra Liberato e Antonio Gonzalez.

 

 

“27 Carroças de Algodão” de Tennesse Williams. Direção coletiva. Foto: Carolina Virguez e Antonio Gonzalez.

 

 

PRINCIPAIS TRABALHOS COMO ATOR EM TV:

                                                                      

“Bambolê” (Armando)- Dir. Wolf Maia – Globo – 1986/87.

“Pantanal” (Bruno) – Dir. Jaime Monjardim – Manchete – 1990

“Amazônia” (Cacique Kria) – Dir.T.Yamasaki – Manchete – 1991/92.

“Agôsto” (Coronel Dornelles) – Dir. Paulo José – Globo – 1993.

“Irmãos Coragem”- Dir. Luis Fernando Carvalho – Globo – 1995.

“Você Decide”, vários. Globo – 1995/96/97/98/99.

“Zorra Total”, vários. Globo 99/00/01.

“Esperança” – Dir. Luiz Fernando Carvalho – Globo – 2002.

“Babilônia” (Zé Henrique) – Dir. Dennis Carvalho – Globo – 2015.

“Totalmente Demais” – Dir. Luiz Henrique Rios – Globo – 2016.   

“ Terra prometida” (Grock) – Dir. Alexandre Avancini – Record – 2016.

“O Outro Lado do Paraíso” – Globo – 2017.

“Sétimo Guardião” (Dr. Cardoso) – Globo – 2018/2019.        

“GÊNESIS” (ALOM) – RECORD – 2021.

 

EM CINEMA:

“Erotique”- Dir. Ana Maria Magalhães – 1993.

“Cheque Mate”- Dir. Ricardo Bravo – 1995.

“Buena Sorte”- Dir. Tânia Lamarca – 1995.

“Tiradentes” – Dir. Oswaldo Caldeira – 1995/96.

“O Dia da Caça”- Dir. Alberto Graça – 1997.

“O Enfermeiro” – Dir. Mauro Faria – 1998.

“Negociação Mortal” – Dir. Marcelo Táranto – 1998.

“A Quadrilha” –  Dir. Jorge Cruz – 1999.

“O Campeão” – Dir. Paulo Thiago – 2016.

“Jorge da Capadócia” – Dir. Alexandre Machafer – 2019.

 

EM TEATRO:

 “Circo Portobello” – 1982.

“Tenesse” – 1983.

“Qorpo Santo – A Impossibilidade da Santificação” – 1984.

“As Três Moças do Sabonete” de H. Daniel – Dir. Milton Gonçalves – 1984/85.

 “O Perú” – 1986.

“Tem um Tenor no meu Banheiro” de K. Ludwig – Dir. José Renato – 1987.

“Casais Marcianos” – 1988.

“Por Falta de Roupa Nova, passei o Ferro na Velha” – 1989/90/91.

“Noite De reis” – 1990.

“Tiradentes” – 1991.

“Soroco, sua Mãe e sua Filha” de Guimarães Rosa. Dir. Aderbal Freire Filho – 1991.

“A Comédia dos Erros” de W. Shakespeare – Dir. Cláudio Torres Gonzaga – 1992.

“O Mercador de Veneza”de W. Shakespeare-Dir. Cláudio Torres Gonzaga – 1993

“Aluga-se um Namorado” de J. Sherman – Dir. André Valli – 1994.

“As Armas e o Homem de Chocolate” de B. Shaw – Dir. C. T. Gonzaga – 1994/95.

“No Verão de 96” de A. F. Filho – Dir. Aderbal Freire Filho – 1996.

 “Fábrica de Dramaturgia” de autores diversos. Dir. Domingos Oliveira – 1998.

“O Avarento”  de  Moliere. Dir. de João Bithencourt – 2000.

“Mais que Imperfeito” de Marcelo R. Paiva – Dir. Rafael Ponzi – 2001.

“Polaróides Explícitas” de Mark Ravenhill – Dir. Ary Coslov – 2002.

“O Último Lutador” de Marcos Nauer – Dir. Sergio Módena – 2016/17.

“Vianinha conta o último combate do homem comum” De Oduvaldo Vianna Fillho – Dir. Aderbal freire filho – 2017.

“A Peça do casamento”, de Edward Albee, direção de Guilherme Weber – 2018/19/20.

 

Entre 2002 e 2015 passou a trabalhar na MultiRio, empresa de TV da prefeitura da cidade do Rio de Janeiro.

Em 2005 é contratado pela Rede Record de Televisão, atuando inicialmente como assistente de direção nas novelas “ESCRAVA ISAURA”, “ESSAS MULHERES”, “LUZ DO SOL”, “CIDADÃO BRASILEIRO”, “MUTANTES” e “PODER PARALELO”, sendo promovido a diretor em 2011. Em 2012, dirigiu as novelas MÁSCARAS e REBELDE, ambas na Record.

Em 2014 e 2015 dirige as séries “Ensinar e Aprender” e “Coletivamente” ambas na MultiRio.

Em 2015 volta a trabalhar como ator na novela “BABILÔNIA”.

Em 2021 está fazendo a novela Gênesis, onde interpreta Alom, um homem atormentado com o sumiço da filha.

Simplesmente:

ANTONIO GONZALEZ

 

 

 

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