INÉDITA! José Karini – Ator. Entrevista NECESSÁRIA.

BLOG/SITE DE CRÍTICAS TEATRAIS E DE DANÇAE FACHETTI PRODUÇÕES

APRESENTA:

O Blog/Site iniciou a temporada de Retrospectivas e INÉDITAS das inúmeras homenagens feitas aos artistas das artes cênicas em geral – teatro, dança, cinema, técnicos:

Operários das Artes – Documento Cultural.

Projeto: “Entrevistas NECESSÁRIAS”, inserido nesse Blog/Site de Críticas Teatrais e de Dança, no começo da pandemia, sendo uma homenagem em forma de Documento Cultural aos artistas de inúmeras áreas do universo artístico.

INÉDITA!!!

Documento Cultural –

Trajetória dos Operários Das Artes:

Entrevista NECESSÁRIA:

JOSÉ KARINI

ATOR

José Karini

Foto de cima por Chico Lima.

“GUERRAS” – Seu Solo feito em 2023.

JOSÉ KARINI – TRAJETÓRIA ARTÍSTICA:

– FORMAÇÃO: CAL (1994); UNIRIO – Graduação em Teoria do Teatro (2002);

– ANGEL VIANNA – Formação em Dança Contemporânea (2005), Terapia Através da Dança (2007) e Pós-Graduação em Estéticas do Movimento (2009);

– PUC – Pós-Graduação Latu Sensu ARTE E FILOSOFIA (2014) e Pós-Graduação Latu Sensu FORMAÇÃO DO ESCRITOR (2023).

– OUTROS: aulas de canto, violão, lutas, workshops com diversos diretores e artistas da cena, cursos livres de dança, teatro, etc.

– TEATRO: Desde 1990, já são quase 50 espetáculos.

A partir de 2001, inicio a trajetória dentro da Cia Os Dezequilibrados, com direção de Ivan Sugahara.

O primeiro espetáculo foi ‘Bonitinha, mas Ordinária’ (2001) e o último foi “Rio 2065” (2019).

“Vida, o filme” (2002); “Um Quarto de crime e castigo” (2022); “Combinado” (2003); “Dilacerado” (2004); “Quero ser Romeu e Julieta” (2005)’; “Últimos remorsos antes do esquecimento” (2007); “Memória afetiva de um amor esquecido” (2009);

“A Estupidez”; “Amores”; “A Serpente”; “Beija-me como nos livros”; …

“Trabalhei, ainda com direção de Ivan Sugahara, em espetáculos fora do grupo: ‘Mulheres Sonharam Cavalos’; ‘Branca’; ‘Terra do Nunca’, etc”.

“Outros parceiros artísticos: Felipe Vidal: ‘Rock’n’roll’; ‘Tentativas Contra a Vida Dela’ e Depois da Queda’. Moacir Chaves: ‘Labirinto’ e ‘Retorno ao Deserto’. Fernando Lopes Lima: ‘O Banqueiro Anarquista’. Erika Mader: ‘Os Insones’. Marcelo Pedreira: ‘2 x 1/4’. Adriano Coelho: ‘Edipo e o Rei, um acidente mitológico’. Priscila Vidca: ‘Contracapa’, entre outros”.

“Meu parceiro artístico mais constante ultimamente é Renato Carrera, com quem fiz “Vestido de Noiva”; “Malala, a menina que queria ir para a escola”; “Ielda”, “Por detrás de O Balcão”; “O Balcão” e meu mais recente espetáculo, o – Solo “Guerras”.

“Com vários desses espetáculos rodei o Brasil (principalmente através do Palco Giratório) e fui a um festival em Oeiras, Portugal”.

Entrando na INÉDITA

Entrevista NECESSÁRIA com:

JOSÉ KARINI

01 – Francis Fachetti – Exponha, torne conhecido para todos, com seu olhar e experiência de Operário das Artes, essa sua imersão de extremo necessário no corpóreo, na fisicalidade atoral através da respeitada Instituição Angel Vianna; foram elas:

‘Formação em Dança Contemporânea’; ‘Terapia Através da Dança’; ‘Pós-Graduação em Estéticas do Movimento’.

Esmiúce o processo de cada uma delas para o aprendizado na trajetória de José Karini.

José Karini – Quando iniciei meu processo na Angel eu já fazia teatro há 12 anos – já tinha me formado pela Cal -, finalizado minha graduação em Teoria do Teatro pela UniRio, e já tinha feito diversos espetáculos profissionais.

Minha questão, naquele momento, era o corpo do ator.

Eu estudava o Barba, o Grotowski, Mímica Corporal Dramática e tudo mais que eu pudesse para me informar e refletir sobre a questão corporal no ator, mas ficava tudo um pouco no plano teórico. E eu sentia a necessidade de trabalhar meu corpo na cena de uma maneira mais prática.

Foi aí que a maravilhosa escola Angel Vianna caiu como uma luva em minha trajetória e em minha vida. Ali eu pude realmente experimentar o corpo em ação, o corpo em movimento.

No sentido mais pleno da palavra. A qualidade do trabalho realizado naquela escola não pode ser traduzido em palavras, apenas pela experiência pessoal é possível entender de alguma forma, até porque a experiência, necessariamente, será diversa em cada corpo. Eu poderia falar aqui em consciência corporal e em outros conceitos utilizados para se referir ao trabalho de Angel, mas seria redutor.

O que posso afirmar por experiência própria é que você consegue, com o trabalho, modificar a percepção do próprio corpo, na cena e na vida. Acho que esse é o grande ganho. E nesse sentido, todas as formações que fiz na escola dialogam – claro que a formação em dança contemporânea prioriza determinadas técnicas voltadas para o dançar, assim como a formação em terapia através da dança prioriza outras. Mas, tudo está o tempo todo trabalhando o corpo em sua globalidade, em sua percepção e em sua ‘presença’.

Acho que é aí que poderíamos dizer que se trata de uma escola também para atores e não apenas para bailarinos e terapeutas. Ou seja, o trabalho de Angel afirma, prioriza a diferença. E pode ser utilizado com muita potência em qualquer área que se queira: artística, terapêutica, etc.

No meu caso, serviu para potencializar e iniciar a busca de meu corpo cênico. Tenho no corpo, até hoje, as ressonâncias desse trabalho. No sentido de que, ao modificar a percepção do corpo, sua visão de mundo também é modificada e torna-se impossível retornar. E isso de um modo absolutamente concreto – sem nenhuma ligação com alguma coisa exterior ao corpo.

O trabalho, a percepção, o próprio entendimento, chegam pelos ossos, pelas articulações, pela bacia, pelo contato direto com o chão, com o corpo do outro, etc.

Enfim, acho que em linhas gerais é um pouco por aí, pois considero o trabalho feito naquela escola tão sofisticado que poderíamos ficar a entrevista inteira falando apenas sobre ele.

Angel Vianna.

1.1 – Francis Fachetti – Curioso para saber sobre esse seu recente submergir (2023) na Pós-Graduação Latu Sensu Formação do Escritor. Como foi essa apreensão nessa área narrativa?

José Karini – Essa pós surge um pouco como consequência de uma outra, em Arte e Filosofia, que também fiz na PUC.

Eu diria que essas duas experiências tem a ver, como sempre, com minha busca atoral, é ela o meu guia em todos os estudos que faço, sejam formais ou informais – e depois de toda a busca realizada na Angel, a partir das questões do corpo, senti a necessidade de pensar um pouco o trabalho utilizando conceitos que pudessem me ajudar a entender a cena de outros modos.

Nesse sentido, a filosofia foi bastante consistente, principalmente porque a pós em Arte e Filosofia trabalha diretamente com os conceitos filosóficos ligados à estética, ou seja, já vai direto ao ponto que interessa para os meus estudos.

Foi então que, como consequência natural, surgiu a necessidade de escrever, articular um discurso próprio utilizando todas essas referências estudadas.

Minha pós em Literatura/Formação do Escritor entra, portanto, nesse momento. E foi ótimo, pois encontrei ali todas as ferramentas – práticas e teóricas – para desenvolver uma escrita. E

Minha proposta ali foi desenvolver e pesquisar uma espécie de escrita performática, buscar o caráter performático dentro da literatura. Vários autores que trabalham com essa noção foram estudados e, como resultado final da pós, surgiu meu primeiro trabalho solo, ‘GUERRAS’, com a direção do Renato Carrera.

Em cena com “Guerras” – Direção: Renato Carrera.

“Guerras” – Direção: Renato Carrera.

02 – Francis Fachetti – Relate o que achar relevante na sua caminhada dentro da Cia Os Dezequilibrados; Fale sobre o processo de trabalho do incrível Ivan Sugahara.

José Karini – Desde 2001 faço parte da Cia e é esse o lugar onde me desenvolvo como artista.

A formação atual do grupo já vem desde a montagem de ‘Bonitinha, mas Ordinária’, do Nelson, na Casa da Matriz, exatamente em 2001. Ali, entramos eu, a Letícia Isnard e o Saulo Rodrigues. O Ivan, a Cris Flores e a Ângela Câmara já estavam no grupo.

Nossa pesquisa se dá principalmente pela ocupação de espaços não convencionais, embora já tenhamos feito espetáculos em palco italiano também.

No caso de Bonitinha, por exemplo, ocupamos toda a Casa da Matriz, sendo que o processo de ensaios aconteceu na própria Casa. Chegávamos pela manhã e ocupávamos a Casa até o momento em que o bar e as atividades noturnas deviam começar. E durante a temporada, tínhamos que chegar às 16h para arrumar a Casa, fazer o espetáculo às 20h e devolver a Casa até às 23h, sendo que a peça tinha duas horas e meia de duração.

Foi um processo de imersão profunda que durou quase dois anos. Acho que esse espetáculo definiu muito nossa trajetória posterior, pois foi um aprendizado muito importante dentro desse conceito de fazer teatro fora do teatro.

Essa pesquisa de espaços não convencionais se transformou na marca registrada do grupo. E o Ivan começou a trabalhar de maneira muito vertical nesse lugar.

O espetáculo seguinte, ‘Vida, o Filme’, ocupou o saguão do antigo Espaço Unibanco, atual Net Rio. A peça começava meia-noite, depois que acabavam as sessões de cinema e foi incrível poder falar, em um espaço de cinema, de questões relacionadas ao atravessamento entre vida e arte, realidade e ficção, cinema e mundo real.

Além disso, depois dessa peça, começamos e entender que o processo de construção (ou desconstrução) de personagens seria entendido e pesquisado a partir de cada processo – ou seja, não iríamos criar uma forma de trabalhar para os atores do grupo. Acho que esse ponto foi a principal descoberta do Ivan e o start no seu processo de direção: construir de acordo com o que está pedido na cena, naquela cena específica, sem nada pré-concebido. Isso, inclusive, acabou levando (na minha opinião, claro) a que cada ator fosse desenvolvendo um jeito próprio de se colocar no trabalho. E com isso não estou dizendo que não trabalhávamos com referências. Claro que os princípios que todos já haviam estudado de um jeito ou de outro estavam ali, de Stanislavski a Brecht, de Artauda Barba, etc.

Tudo servia e era articulado com um único propósito: resolver aquela cena específica. E assim fomos criando o nosso método, que é o de não ter um método pré-concebido.

Francis Fachetti – Discorra um pouco sobre o desenvolver dos seguintes espetáculos:

‘Memória Afetiva de um Amor Esquecido’; ‘A Estupidez’; ‘Amores’, ‘A Serpente’; ‘Beija-me Como nos Livros’; ‘Rio 2065’; ‘Um Quarto de Crime e Castigo’; ‘Mulheres Sonharam Cavalos’; ‘Branca’ – Ufa!!! Conte-nos, precisamos saber pela sua ótica.

José Karini – São realmente muitos espetáculos (rs).

Começo por ‘Um Quarto de Crime e Castigo’ porque esse espetáculo acontece antes de ‘Bonitinha’ e já aponta, acho que, na verdade, dá início, à pesquisa principal do grupo, a ocupação de espaços não convencionais.

A peça foi toda concebida a partir de uma adaptação do romance de Dostoiévski e tudo acontecia no quarto de um apartamento na Urca. Cris e Ângela já faziam parte do elenco original e eu acabei entrando em uma segunda temporada da peça.

Ela ficou no repertório do grupo durante muitos anos e sempre se renovando, no sentido de que o texto tem uma potência tal que nunca se esgota. Já ‘Memória Afetiva’ foi espetáculo realizado no Oi Futuro, onde ocupávamos todo o espaço. O primeiro Ato acontecia nas instalações fora do teatro e o segundo no próprio teatro. Ensaiamos durante 1 ano dentro do espaço. Os ensaios, em geral, iniciavam 23h e se estendiam até 3h ou 4h da manhã, em função do horário comercial. Foi uma experiência incrível. Criamos a dramaturgia a partir do filme ‘Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças’, do Michel Gondry. E o espaço se transmutou em uma grande clínica de apagamento da memória, a Be Happy.

Além de atuar, trabalhei também, nesse espetáculo, como assistente teórico.

Já ‘Amores’ e ‘A Serpente’ foram apresentadas principalmente na Sede das Cias, na Lapa, em uma ocupação de três anos que fizemos com outras Cias.

‘Amores’ foi fruto de um desejo antigo nosso de trabalhar com alguma peça do Domingos Oliveira, um dos maiores criadores teatrais do país. Fizemos uma linda temporada, com a presença de Domingos e com a criação de uma relação com ele que se estendeu até sua passagem.

“Amores” de Domingos Oliveira.

Direção: Ivan Sugahara – Sede Das Cias.

Em cena com Angela Câmara.

‘A Serpente’ também foi montada um pouco em homenagem a esse outro gênio de nosso teatro, o Nelson Rodrigues, do qual já havíamos feito, como citado acima, o ‘Bonitinha, mas Ordinária’.

“A Serpente” de Nelson Rodrigues – Teatro Nelson Rodrigues.

Direção: Ivan Sugahara. Na foto com Angela Câmara.

Foto: Chico Lima.

Com ‘A Estupidez’, do dramaturgo argentino Rafael Spreguelburd, fomos para o palco italiano.

Trata-se de uma crítica ácida e feroz ao mundo capitalista e foi apresentada no CCBB – assim como ‘Beija-me Como nos Livros’, pesquisa que também se estendeu por 1 ano e que problematizava a questão do amor, muito recorrente em nossos espetáculos.

“A Estupidez”, de Rafael Spreguelburg.

Direção: Ivan Sugahara – CCBB.

Foto: Chico Lima.

“Beija-me Como Nos Livros” – Direção e Roteiro: Ivan Sugahara.

CCBB.

“Beija-me Como nos Livros”

‘Rio 2065’, peça de Pedro Brício – escrita especialmente para o grupo -, é nosso último espetáculo e também foi apresentada em temporada no CCBB.

Aqui, a temática é principalmente política, vide a situação em que se encontrava o país na época de sua montagem, em 2019.

“Rio 2065” de Pedro Brício – em cena com Leticia Isnard.

Os outros espetáculos que você cita, ‘Mulheres Sonharam Cavalos’, do Daniel Veronèse e ‘Branca’, de Walter DaGuerre, não foram realizados pela Cia, apesar da direção ser do Ivan.

“Mulheres Sonharam Cavalos” de Daniel Verinèse

Direção: Ivan Sugahara.

“Mulheres Sonharam Cavalos” – Teatro Poeirinha – na foto com Saulo Rodrigues.

Espetáculo: “Branca” – Texto de Walter Daguerre.

Direção: Ivan Sugahara.

Foto: Chico Lima.

São muitos espetáculos, parcerias, viagens e experiências múltiplas que só o teatro pode proporcionar e me sinto muito privilegiado por fazer parte dessa verdadeira família – é isso o que um grupo de teatro e o próprio teatro proporcionam a quem o faz –, uma incomparável sensação de pertencimento.

Francis Fachetti – Gostaríamos de saber da sua parceria artística com os diretores: Felipe Vidal; Moacir Chaves; Fernando Lopes Lima; Marcelo Pedreira, Priscila Vidca – grandes Operários Das Artes e seus feitos –, que com certeza deixou um legado precioso na sua carreira.

Cite dois espetáculos feitos com o aporte de dois desses nomes acima e sobre essas arquiteturas cênicas construídas.

José Karini – Ao longo desses 34 anos de carreira, já trabalhei com muitos diretores que foram fundamentais na minha formação, sem dúvida.

Com Felipe Vidal fiz três espetáculos e ‘Tentativas Contra a Vida Dela’, do Martin Crimp me marcou bastante – principalmente pela dramaturgia completamente desconstruída que é proposta e que me instigou muito na busca de uma construção não psicológica em cena – me possibilitando caminhar mais pelo performático.

“Tentativas Contra a Vida Dela” – de Martin Crimp.

Direção: Felipe Vidal

Em cena com Lucas Gouvêa – Foto de Chico Lima.

Com Moacir Chaves foram dois espetáculos e ‘Retorno ao Deserto’, do Koltès – foi muito importante para trabalhar a relação com o texto, com a embocadura, com a colocação da voz, etc.

“Retorno Ao Deserto”- no Teatro Laura Alvim.

Direção de Moacir Chaves.

Essas questões são muito dissecadas nos processos com ele e esse trabalho me ajudou muito nesse sentido. Mas, é claro que, para além das questões do meu próprio trabalho, o fato de se debruçar sobre dois textos icônicos do teatro contemporâneo, tanto na questão formal como temática, foi, por si só, uma experiência única.

Me considero um ator de muita sorte com relação aos encontros profissionais que vivenciei até agora.

Priscila, Marcelo e Fernando, os outros diretores que você citou, também me proporcionaram vivências únicas no teatro, como, por exemplo, ‘O Banqueiro Anarquista’, conto do Fernando Pessoa dirigido pelo Fernando que possui uma atualidade impressionante. Acho que o principal para um ator ou para um artista, principalmente no teatro, é encontrar os parceiros certos – aqueles com os quais você vai se desenvolver, porque o teatro é, necessariamente, coletivo. Ele não funciona de outra forma.

“O Banqueiro Anarquista” de Fernando Pessoa. Teatro Serrador.

Francis Fachetti – Sua parceria atual é com Renato Carrera – mais um seleto Operário das Artes. Quem é Renato diretor, capitaneador cênico; fale do seu caminho na construção para o palco; aproveitando, comente sobre as montagens: ‘Vestido de Noiva’ e ‘O Balcão’.

José Karini – Sim, com o Renato construí uma parceria já consolidada com seis espetáculos, e que, espero, possa continuar a evoluir cada vez mais.

Sem dúvida nenhuma, tenho em Ivan (com ele já foram vinte e cinco espetáculos ou mais) e Renato meus maiores parceiros no teatro. Além, claro, de meus irmãos Dezequilibrados e de todos os artistas talentosíssimos com quem trabalhei.

Mas, a relação ator – diretor se fez, principalmente, com os dois. ‘Vestido de Noiva’, icônica obra do Nelson, foi a primeira peça que fiz com Renato e o processo não poderia ter sido mais gratificante. Depois de ‘Bonitinha’, foi a chance que ganhei de me aprofundar no universo doautor que considero o maior de nossa história. E a relação do Renato com o Nelson também tem uma visceralidade que entendi logo no começo dos ensaios.

Acredito que isso acabou ajudando bastante na construção de nossa parceria, pois a partir desse primeiro encontro, tudo se deu naturalmente.

Como o Renato também é ator, e um ator excepcional, ele entende muito esse lugar solitário do ator no palco e consegue trabalhar em uma comunhão que nos deixa absolutamente seguros na cena, no entendimento da cena. Claro, que a palavra ‘seguro’ é um pouco perigosa, no sentido de que é necessário, também, uma boa dose de insegurança para que a cena se mantenha viva. Ou seja, temos que conquistar a segurança de uma base bem construída e, ao mesmo tempo, deixar espaço para os imprevistos, para o não saber. Só assim, acredito, teremos uma cena contundente e válida.

O Renato sabe muito bem trabalhar com esses princípios. Já ‘O Balcão’, do Genet, é nosso penúltimo espetáculo.

Na verdade, durante a pandemia, fizemos ‘Por Detrás de O Balcão’, espetáculo online que foi uma espécie de estudo e preparação para a montagem de ‘O Balcão’.

A peça foi montada na Arena do Sesc Copacabana e fez uma ótima temporada, com público sedento por teatro ‘ao vivo’ depois de anos de reclusão e com discussões contundentes e apaixonadas, como acontece com qualquer obra de Genet.

“Vestido De Noiva” de Nelson Rodrigues. Em cena com Rita Elmor.

Direção: Renato Carrera.

Teatro Sesc Ginástico

Francis Fachetti – Conte-nos do Festival em Oeiras (Portugal), e o espetáculo que apresentaram lá.

José Karini – Esse foi meu primeiro Festival Internacional e a peça era o ‘Terra do Nunca’, com direção do Ivan Sugahara.

Essa peça não foi realizada pela Cia. e a pesquisa foi desenvolvida a partir de uma temática que priorizava o conceito de envelhecimento. Oscar Wilde, Michel Jackson, Peter Pan, etc, serviram como referências para a construção da dramaturgia, feita também pelo Ivan.

O espetáculo foi muito bem recebido em Oeiras, depois de sua temporada de estreia na Arena do Sesc Copacabana. E ainda fizemos uma outra temporada no Teatro Gláucio Gill, quando retornamos de Portugal.

Foi um processo não tão longo como estávamos acostumados a fazer, mas muito intenso.

Ivan queria trabalhar com esse tema já a algum tempo e, com essa oportunidade que tivemos, conseguimos desenvolvê-lo criando um espetáculo que dialogava com várias referências nossas, principalmente na apropriação de elementos da cultura Pop.

“Terra Do Nunca”.

Direção e Roteiro: Ivan Sugahara – em cena com Letícia Isnard.

Sesc Copacabana.

Francis Fachetti – Para terminar com chave de diamante, como sempre digo, abra o ‘livro’ da montagem do seu recente solo: ‘Guerras’ – fale todos os pormenores possíveis e impossíveis.

O que foi esse solo para José Karini? Para você enquanto ator, qual sua avaliação? O que deu certo e o que deu errado? Voltará em cartaz? E se voltar, diga quando, onde e o porquê?

Um Solo pode ser um abismo sem fim para um ator ou sua redenção/libertação. O que ele foi para você?

Avalie-o para nós de coração aberto.

José Karini – Então, considero essa experiência o resultado de uma necessidade antiga de me colocar como ator e, também, idealizador de um espetáculo.

No sentido mesmo do pensamento, do articular um discurso que seja seu e que você queira colocar no mundo. Não que como ator eu não construa um discurso.

O ator é um criador, assim como todos os profissionais da cena, mas, no caso de ‘Guerras’ – a coisa nasceu de mim e esse fato foi absolutamente novo na minha trajetória.

Em um primeiro momento tive a parceria do Renato Carrera e foi ele quem me deu a confiança necessária para seguir com o projeto. Como disse acima, ‘Guerras’ surge como resultado de minha pós em Literatura, onde trabalhei com o conceito de Sampler (importado da música, esse conceito propõe a coleta de materiais textuais do mundo e sua colagem/mixagem em uma nova obra que pode se dizer original).

Obviamente existem muitas discussões e opiniões, contrárias ou favoráveis, quanto à validade desse procedimento.

No caso de ‘Guerras’, resolvi pesquisar discursos políticos em um primeiro momento, desde os primórdios do fascismo até os mais contemporâneos e, posteriormente, foram incorporados também discursos artísticos e filosóficos.

Vários artistas foram chamados para o processo.

O Sidnei Cruz entrou e assumiu, a partir de minha pesquisa, a dramaturgia.

O Daniel de Jesus fez cenário, figurino e direção de arte.

O Leandro Barreto a luz, a Simone Nobre a preparação corporal, o Jan Marcel Gatti fez uma luxuosa assistência de direção e o CCBB cedeu a pauta que nos permitiu estrear no Espaço III. Foi mágico!

Eu não esperava que fosse chegar nesse ponto, mas o Renato sempre incentivava e acreditava muito no potencial do espetáculo.

As críticas foram ótimas e a peça lotou durante as seis semanas em cartaz. Agora estamos no processo de tentar circular com ela antes de fazer uma possível segunda temporada.

Quanto à sua última pergunta, abismo ou redenção, acho que as duas ao mesmo tempo (rs).

O teatro precisa passar pelo abismo para acontecer em sua máxima potência até chegar a alguma espécie de redenção, seja ela qual for. E, no caso de um Solo, isso fica muito claro. Ainda mais para mim, que fiz, com ‘Guerras’, o meu primeiro.

Então, para finalizar, posso dizer que esse trabalho, independente do resultado, me transformou como ator e me fez entender que a busca é permanente, só vai acabar quando você mesmo não estiver mais por aqui.

José KARINI em: “GUERRAS”

Direção: Renato Carrera

Dramaturgia: Sidnei Cruz

ALGUNS OUTROS TRABALHOS QUE MARCARAM A TRAJETÓRIA DE KARINI:

Espetáculo: “Ielda – Comédia Trágica”.

Texto e Direção de Renato Carrera.

Espetáculo: “Ielda – Comédia Trágica”

Texto e Direção: Renato Carrera.

Espetáculo: “Malala, a Menina que Queria ir para a Escola”.

Direção de Renato Carrera – apresentada em diversos teatros em todo o Brasil.

Espetáculo: “2 x 1 Quarto”

Texto e Direção: Marcelo Pedreira

Na foto com Carla Marins.

Simplesmente:

JOSÉ KARINI

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