O Blog/Site, abdicou, por enquanto, das críticas teatrais e de dança, por motivo pandêmico – mergulhando nas entrevistas NECESSÁRIAS – acendendo os holofotes na vida e carreira de vários artistas, da cena teatral e de dança, amenizando nossa dor, nesse período de trevas.
É um enorme prazer trazer para esse espaço das artes, o adorável, necessário; autor, produtor, diretor teatral, artista de várias funções, e ser humano delicioso – Marcio Azevedo.
Marcio, foi produtor de elenco da TV Globo de 1997 a 2003. Onde se infiltrou através de uma produtora chamada Lucinha Camargo; que ensinou tudo a ele.
Sua mãe trabalhou 33 anos na Globo, e seu pai foi cenógrafo na mesma TV.
Durante seis anos esteve ao lado de Maria Clara Machado no Tablado.
No ano 2000 foi convidado pela livraria Letras e Expressões, para fazer um recital sobre Drumond. Propôs que fosse um espetáculo de Chico Buarque, aceitariam, sob a condição, dele conseguir a autorização de Chico.
“Versos de Hollanda”, ficou dez anos em cartaz, e o Chico foi assistir no último dia.
Elaborou um curso, no tempo que esteve na Globo, chamado: “O ator no mercado de trabalho”. Nesse curso dá dicas, ensina os “truques”, “macetes”, que te colocam no mercado de trabalho.
O espetáculo “Verborrágica”, marca a volta e triunfo de Inês Galvão, que estava afastada a 20 anos. Uma comédia com tremendo sucesso em sua primeira temporada, porém, quando trocou de teatro, segundo Marcio, foi um fracasso – paradoxo total. Coisas de teatro.
“Noiva de Cristal”, foi um grande acontecimento na carreira desse diretor querido. Ele diz que é uma das peças que mais gosta. Estreou em Porto Alegre, foi concebida em 8 dias, para variar, mais uma história incomum na sua carreira.
“Corta”, Marcio também dirigiu no meio de uma grande confusão entre autor e atriz. Teve que reescrever o texto, e ajustá-lo para estrear. “Corta”, foi um sucesso, lotando o Clara Nunes, com todos pagantes; um momento de achádego na cena teatral.
O maior sucesso de Marcio Azevedo é o belíssimo, contundente e necessário espetáculo: “Eu sempre soube”, com a dileta/adorável atriz Rosane Gofman, com produção da competente Andréa André. Ganhou cinco prêmios; maior prêmio de dramaturgia – FUNARTE 2018.
“Eu sempre soube”, foi concebido através de entrevista com 99 mães, relatando um cenário de preconceito ferrenho e assustador, homofobia a flor da pele, e essa peça é um divisor de águas na vida e carreira do diretor.
”Eu sempre soube”, foi comprado por Herval Rossano Filho, e já foi traduzida, para ser montada no Chile. Assim como, foi traduzida para língua francesa, e será descortinada na França. A família do diretor mora toda lá.
No momento está fazendo uma série para TV, também com Heval Rossano Filho, chamada: “Quarentena Russa”.
Passando esse momento obscuro, estreia um espetáculo que fala de compaixão, amor ao próximo, depressão, suicídio e Florbela Espanca.
No dia 12/3, aconteceu uma leitura encenada desse trabalho; fui conferir essa necessária empreitada teatral, com texto conflituoso, imponente e amalgamado com nosso momento atual. Uma ode a trajetória emblemática da poetisa portuguesa FLORBELA ESPANCA, também conhecida como: FLORBELA D’ALMA DA CONCEIÇÃO ESPANCA.
Marcio Azevedo faz em sua escrita um recorte emocionante do colérico e importante trajeto de vida de FLORBELA. Uma direção coletiva, junto com Sueli Guerra e Daniel de Melo. Atuações comprometidas e inquietantes de Rita Porto e Renata Ferraz. Produção de Andréa André. Aguardem!
– Mergulhando na entrevista NECESSÁRIA:
Fachetti – Com certeza, através de sua ascendência – pai e mãe ligados direto com a arte – você se empoderou de sua caminhada artística lindamente. Fale um pouco da época de seus pais na Globo, e a sua chegada lá.
Azevedo – Eu tive a boa sorte de nascer numa família de artistas; meu tio é o autor do filme: “Assalto ao trem pagador”, meu avô foi fotógrafo da “Revista Cruzeiro”, ele era exclusivo da Angela Maria, Maysa e Cauby. Meu pai era cenógrafo, e minha mãe continuísta, e assistente de direção. Eu cresci numa casa que se falava arte, respirava arte, que se alimentava dia e noite com boa música, bons filmes, boa programação na TV. Eu brinco que a minha baba foi a rede globo, eu estudava em frente à Globo. Saia do colégio, atrevessava a rua, entrava no estúdio, e ficava lá, onde minha mãe trabalhava.
Minha mãe casou seis vezes com pessoas do meio. Meus padrastos e meu pai eram do meio. Fui crescendo no meio deles. Batia altos papos com Silvio de Abreu. A globo dessa época era ótima! Era perfeita, uma empresa familiar.
Com 15 anos, minha mãe teve a luz de me mandar para o Tablado, e lá eu achei minha turma. Não tinha como não ser desse meio. Depois, comecei a trabalhar como produtor de elenco, aos 22 anos, ao lado, junto, com LUCINHA CAMARGO, minha maior referência, “estou até emocionado”, ela me ensinou tudo; trabalhar, ter ética no trabalho. Ela me pediu apenas uma coisa – para eu não mentir, lá dentro da TV; me dizia: “Não misture trabalho com cama”, por que senão você vai perder seu nome, que é seu bem mais precioso. Fiquei seis anos no projac, e me dei conta que não estava feliz, mesmo fazendo aquilo que amo. Foi quando me convidaram para fazer “Versos de Hollanda”, no teatro. Sai da Globo, fui para o teatro e estou até hoje, onde estou feliz, e nunca fiquei sem comida, sem dinheiro, e nem prazer.
Fachetti – “Verborrágica”, marca a volta e o triunfo de Inês Galvão nos palcos. Uma comédia com grande sucesso. Nos conte sobre esse trabalho, e o paradoxo, que obteve nas duas temporadas.
Azevedo – Ines Galvão é um marco na minha vida, é um bastão de Moisés, ela, Debora Duarte e Rosane Gofman – três atrizes que me mudaram como diretor.
Ines Galvão é um fenômeno, por que ela pega um texto que ela nunca viu na frente dela, olha para o papel, e pede 15 minutos. Depois disso, ela não perde uma palavra do texto. Todos os cacos que ela coloca, são melhoras para o que você escreveu – é uma coautora, tudo que escrevo ela vai melhorando. Se tornou uma companheira para vida, é uma das minhas melhores amigas.
“Verborrágica”, é a volta dela. Começou como um espetáculo de poesias. Ela falava Fernando Pessoa, e a gente ria sem parar. Ela falava Florbela Espanca e a gente ria o tempo todo. Ela tinha acabado de ficar viúva, e começamos a perceber que a peça era toda para o marido que tinha falecido; poesias que falavam de perdas, falavam de ausência. Como ela é uma boa comediante, exergamos que estávamos no caminho errado. Resgatamos esse texto, e fomos brincar com ele. Estreamos, com Ines morrendo de medo; 20 anos fora dos palcos, e foi um sucesso. Teve gente que assistiu várias vezes. O teatro queria renovar conosco, mas o produtor, queria ir para o Teatro Vanucci, e fomos – achando que seria o mesmo sucesso. No Vanucci não deu certo mesmo. A equipe do Vanucci excelente; Ingrid, Lucia, etc. Não deu certo, não foi bacana mesmo.
A peça é ótima! Tenho boas memórias, memórias maravilhosas! Ficou esse aprendizado, saímos de um lugar, que tínhamos que ter ficado.
03 – Com o incêndio no Teatro Clara Nunes, perdeu duas peças. Fale um pouco sobre isso, e de onde vem essa garra, esse vigor artístico, sempre conectado com muita empatia.
Azevedo – Foram duas peças: O “corta”, com patrocínio de uma multinacional americana e o “Super Moça”, que ia estrear. Tinha vendido meu carro, pronto para ir à Nova York, e coloquei todas as fichas nesse espetáculo. À atriz Izabella Van Hecke, tinha posto todo o fundo de garantia que recebeu da Varig, era comissária de bordo, colocou tudo ali também.
O dono do teatro resolveu fazer uma obra, e continuamos com as peças em cartaz no horário nobre, com os dois espetáculos. Faltando três dias para estrear, o teatro pega fogo, e perdemos tudo, tudo… foi muito triste, você entende essas tragédias que vê na TV. Você perde sua identidade, não sabe quem é você. Ficamos em estado de choque. Bem, quem tem amigos, tem tudo. Nunca pedi dinheiro para ninguém, nunca tinha feito vaquinha para minhas peças. Uma amiga fez a vaquinha e colocou no ar, sem eu saber. Em quatro dias conseguimos recuperar tudo que tínhamos perdido.
Eu tenho uma superstição, que peguei da Maria Clara Machado; não adio estreia. Se tiver que adiar, dou uma solução para fazer uma pré-estreia. O porquê da superstição? A primeira pessoa que convido é Deus. Sou muito temente a Deus. Eu acho que ele marca na agenda dele, esse meu convite. Se eu não cumpro, minha sorte vai embora. Haja o que houver, eu estreio no dia que está marcado.
Pedi para fazer na porta do Shopping, e o dono não deixou. Disse que chamava a polícia. Fui para a praça Santos Dumont, e fiz lá. Avisei a todos pelas redes, que iriamos estrear na praça. Deus me achou muito abusado, ousado, e resolveu me desafiar, mandando um dilúvio. Chovia como eu nunca vi. Não desisti. À atriz queria desmarcar, eu disse que não, se ela não viesse, faria sozinho, me visto de aeromoça e faço; eu sabia o texto. Ela fez debaixo de chuva, com mais de cem pessoas de guarda-chuvas. Muito emocionante ver todas aquelas pessoas nos aplaudindo, embaixo de chuva. Fez a peça inteira no gogó.
Foi uma peça que teve algumas indicações a prêmio. Em SP, fizemos com todos os ingressos esgotados, todos! A temporada inteira, com sessões extra todos os dias. RJ, passamos por todos os teatros, sempre com casa lotada. Vamos fazer agora uma apresentação online. Aguardem! Um espetáculo que está sempre nos surpreendendo. Izabella é um talento.
04 – “Noiva de Cristal”, como você diz: “Um grande acontecimento na sua carreira”. Concebido em Porto Alegre, com a história da sua família. Detalhe, com suas palavras, o que achar relevante.
Azevedo – Esse trabalho é um medalhão que carrego no peito, de orgulho. Conheci Ana Guasque que é uma atriz e produtora de Porto Alegre. Trocamos trabalhos. Um dia, Ana me liga e diz que quer montar “Noiva de Cristal” em Porto Alegre.
Esse texto meu, poético, baseado numa história familiar minha, de uma prima, que o noivo abandonou, e ela foi para o sanatório, passando pelas piores torturas, durante 15 anos.
Escrevi o texto com poesias, desenhado por Lima Barreto, Fernando Pessoa, Florbela, Cruz e Silva, Augusto dos Anjos, Drumont; vai nesse caminho. Hoje não, mas eu não deixava ninguém dirigir nada meu. Resumindo, fui para Porto Alegre, e nada do que tínhamos combinado estava de pé, faltando dez dias para estreia. Descobri que eles não tinham feito nem uma leitura, nada do que combinei com ela. A peça tem quatro atores, mas é um monólogo, a Ana que carregava o espetáculo todo. Peitei o pouco tempo que tinha, 10 dias, e fiz como num processo de televisão, em ritmo de TV. Para minha grata surpresa, a Ana tinha tudo decorado, e o resto do elenco sabia tudo da história. Foi uma delícia de fazer. No quinto dia o espetáculo estava pronto, de pé. Nunca aconteceu isso comigo. No oitavo dia a Ana perdeu a voz, dei descanso de um dia, e estreamos no décimo dia. A peça foi um sucesso. Fiz RJ, SP, sempre lotado. Fiz uma sessão no Rio para moradores de rua, e alguns já tinham passado por eletrochoque, já tinham sidos internados, isso me tocou demais. Sempre depois do espetáculo, eu tinha um psicólogo para falar sobre o tema, sobre o abandono. Foi muito bonito, sou muito orgulhoso desse trabalho.
05 – “O ator no mercado de trabalho”, instigante e perspicaz. Como desenredou esse curso? Ainda ministra ele? Como funciona?
Azevedo – É um “xodó” que eu tenho. Deveria mudar minha forma de pensar, deveria pensar no lucro, no dinheiro, mas, para mim a arte está em primeiro lugar. Minha posição como artista é: o que vou melhorar no mundo com minha arte? Se uma pessoa for tocada, graças ao que eu escrevo, ou dirijo, para mim valeu à pena.
Esse curso é um workshop de 4 horas, que eu viajo pelo Brasil, ministrando; onde eu peguei todos os erros – sou muito observador nos lugares – e anoto tudo. Fui anotando por que aqueles atores eram queimados com os diretores, por que eles rejeitavam aqueles atores, o que eles falavam, quando todos iam embora. E percebi, que os erros repetiam sempre.
O ator está sempre ansioso. Por ingenuidade, pressa, sem salário. Percebi que eles erravam no mesmo ponto, e fui anotando cada detalhe. Todos as formas que os atores se comportavam, das roupas às atitudes. Enfim pequenos erros; na escolha do texto etc. Primeiro grande erro do ator: “Não saber dimensionar o tamanho do seu talento”. Você tem que saber o que você é realmente, na prática. Às vezes você tem que começar por um papel menor, pegar experiência. Tem pessoas que querem fazer logo um protagonista, e se queimam, o mercado não compra. Pode até conseguir através de um pistolão, etc. Não vai conseguir o segundo papel dessa forma. Tem que ter o talento, e estudar. Nenhum curso de teatro vai te ensinar a ter talento, você nasce com ele, ou sem ele.
No curso você vai aprender a técnica, os macetes. Se o ator não for para o palco, não vai viver. Só Glória Pires que sobreviveu sem o palco. Ela se criou no meio de atores de teatro, essa é a diferença. Pessoas que ensinavam para ela o que se aprendia no palco. O palco é o grande professor de qualquer ator.
Esse workshop é onde eu ensino coisas onde não se ensina em faculdade. O lado sujo do meio, que ninguém tem coragem de falar. As dificuldades reais, e dou dicas que vão agradar os diretores. Eu trabalhei com os melhores, tive essa boa sorte. Como os diretores gostam de receber o material, como se portar num teste, sua postura. O que chama atenção num teste, além do talento – tudo isso é “O ator no mercado de trabalho”.
06 – Teve que reescrever rapidamente o texto de “Corta”. É habitual sempre “apagar o fogo nas coxias”, com o universo a seu favor. Como foi isso, lotando o Clara Nunes com pagantes? Um momento de achádego na cena teatral.
Azevedo – Meu melhor amigo se chama Juliano Almeida, ele foi produtor da Elza Soares, agora é o produtor da Zabelê; e ele produz teatro – tem uma empresa que produz teatro. Nós somos mais que amigos, somos irmãos, irmãos mesmo. O Juliano “pegou fogo”, teve um incêndio teórico, vamos dizer assim, vai ter o prático também.
O autor e a atriz brigaram feio, tinham recebido o patrocínio, teriam que devolver, se não resolvesse aquilo. Juliano me pediu, por favor, me ajuda a resolver isso. Precisei reescrever o texto, para deixar no tom que os atores queriam. Eu disse que não seria ético se apropriar da obra de outro, e fazer outra. Fui para casa do autor, o querido Vini Soares, que estava magoado com a situação. Sempre me coloco no lugar das pessoas, e entendi os lados de todos. Reescrevi o texto com ele. A Dadá Coelho acabou entrando no lugar da outra atriz, e era um encontro que eu precisava ter tido, ela foi um dos divisores de água na minha vida. Com pouco tempo para fazer, fizemos. Foi um sucesso, a gente lotava o Clara Nunes, até o teatro pegar fogo, e a gente perder tudo, tudo.
Quando o Clara Nunes reabriu, com 800 lugares, colocamos casa lotada com todos pagantes, acho que fomos os únicos. Um sucesso estrondoso. Todos queriam ver a volta de tudo que foi queimado no incêndio. Voltamos com tudo igual; cenário, figurino, mesma qualidade, até mais. “Corta” é isso, um exercício que fez eu reescrever o texto em 24 horas. Muito bacana!
07 – Fale para nós, como conseguiu a autorização para montar uma obra de Chico Buarque; “Versos de Holanda”, um sucesso que foi parar em Nova York.
Azevedo – “Versos de Hollanda”, daria uma minissérie, à parte, todo processo do verso. Fui convidado no ano de 2000, para fazer um sarau, no Letras e Expressõe; sobre Carlos Drumond de Andrade. Eles queriam um sarau caretinha, todo mundo falando, meio que jogral, e eu tenho pavor a isso. Isso que faz o preconceito com a poesia, a poesia foi feita para ser sentida, senão vira outra coisa. Eu disse: “em vez de ser Drumond, a gente não pode fazer Chico Buarque? Disseram que poderia, porém, não tem a autorização dele, você vai ter que buscar.
Sai de lá e fui direto para empresa do Chico. Fui atendido por Marilda Ferreira, que hoje é uma das minhas melhores amigas; sem hora marcada. Disse que queria falar sobre os direitos de Chico. Ela mandou eu entrar, e perguntou que obras eu queria, eu disse que queria o direito de todas. Era meu primeiro trabalho como diretor teatral. Ela perguntou quanto eu tinha para oferecer; eu disse que nada, pois era um sarau com entrada franca. Disse que poderia oferecer todo último domingo do mês, e daria a renda toda para a Casa de Maria Magdala, que é uma casa que cuida de crianças soro positivas, em Niterói. Até hoje eu faço esse trabalho com a Magdala. A casa precisa de tudo, muita coisa.
A Marilda disse que iria mandar o e-mail para o Chico, mas achava muito pouco provável que ele autorizasse. Ela disse para eu rezar, e me apegar com uma boa mãe de santo.
Passaram-se três dias, ou mais, toca meu telefone, era a Marilda dizendo: “me dê o telefone da sua mãe de santo, pois o Chico autorizou tudo. Está tudo certo”.
Estreamos em 2000, “Versos de Hollanda” ficou em cartaz sem parar até 2009. Quase dez anos, de casa cheia, de histórias lindas. Como eu era produtor de elenco da Globo, toda noite tinha uma participação especial, com muitos atores. Vários, inúmeros artistas, cantores conhecidos; faziam números no meio do espetáculo.
Houve um dia, quando terminou o espetáculo, uma mulher se apresentou, Marcia Flores, que dava patrocínio da Eletrobrás, e disse que queria patrocinar o trabalho. Ganhamos 154,00 mil reais – em 2007 era muito dinheiro.
Fomos para o Teatro do Leblon, com um belo figurino. Indicados ao Shell de melhor iluminação, com Aurélio de Simoni. Foi muito lindo!
A peça ia para NY, chegamos a ter 3 ensaios lá, no quarto ensaio, numa reunião, descobri que “Versos de Hollanda” tinha sido plagiado no Maranhão. Estavam fazendo, com o mesmo cenário, figurino. Aí eu voltei de NY, para resolver isso. O cara que plagiou, fez uma retratação pública. O advogado do Chico nos defendeu, e ele teve que fazer uma retratação dizendo que tinha roubado a ideia, com essas palavras. Com isso não aconteceu mais em NY. Pretendemos fazer de novo lá, e voltar aqui no Brasil.
O Chico foi ver na última semana, no décimo ano, numa sessão fechada para ele, onde ele levou 250 pessoas de uma ONG que nunca tinha ido ao teatro. Emocionante! Foi muito bonito!
08 – Pode nos contar sobre “Quarentena Russa”? Série de TV, que está desenvolvendo no momento?
Azevedo – É um presente na minha vida, a realização de um sonho, meu primeiro trabalho para TV, com um diretor tão poderoso – Herval Rossano Filho – como se fosse o Boni do Chile, diretor mais famoso de lá. Graças a minha mãe tivemos um encontro e ficamos muito amigos, isso é mais importante do que o trabalho. Um cara que admiro, culto, e muito bom no que faz, tem me ensinado demais. Trabalhar com Herval, tem sido uma faculdade; um mês eu fiz 4 anos de faculdade, de roteiro.
Uma série de doze capítulos, uma história de amor engraçada, uma comédia romântica, sobre um escritor avesso a relacionamento. Um cara que come as mulheres e descarta. A irmã dele, que está na Rússia, pede um favor a ele. Ela diz “Mauro estourou na quarentena, tudo fechado, e a noiva do meu chefe está no aeroporto sozinha; ela é russa, não fala uma palavra em português. Estou mandando ela para sua casa”. Ela fica 30 dias, que eles passaram juntos. Quando ele vê a mulher, se apaixona por ela naquele instante. Eles não falam uma palavra da língua de um, nem do outro. A síndica do prédio, faz um inferno na vida dos dois.
Foi um aprendizado, um orgulho que tenho muito grande. Foi difícil, doloroso. Fiquei 3 dias mal, a ponto da minha mãe ficar rezando, para que minha criatividade viesse. Eu sabia que podia fazer, mas nunca tinha escrito uma minissérie. 3 dias olhando para o computador, sem conseguir escrever uma palavra, e com a ideia toda na cabeça. Venci a barreira do medo, e escrevi uma série em 19 dias, sozinho, isso para mim é motivo de muito orgulho, sem colaborador. Uma série para TV.
Fachetti – “Eu sempre soube”; que surpreendente desenlace teatral. Rosane Gofman visceral. Texto atualíssimo e contundente; mexe na ferida. Fale o que quiser sobre. Será traduzido para ser montado no Chile e na França, não é? Como eu digo: Espetáculo NECESSÁRIO!
Azevedo – “Eu sempre soube” tem sido uma caixa de surpresas, a começar pelo prêmio – Primeiro lugar na FUNARTE – último prêmio que a Funarte deu para dramaturgos. Concorri com 2500 colegas, não posso revelar nomes. Colegas de muito prestígio, pessoas que estão escrevendo a muito tempo. Ganhei com uma nota bem mais alta dos que os outros. Me emocionou muito, fiquei muito feliz.
Desde quando saiu do computador, que vem causando surpresas. Uma delas, foi o Herval Rossano Filho, que comprou os direitos para fazer no Chile, e ele foi traduzido para o francês, e está indo para França também, para ser montado lá. Em 2021 fazemos no Chile, e depois na França. Uma possibilidade de fazer em Portugal. 3 países já.
Aqui no Brasil continuaremos. Eu digo que “Eu sempre soube”, não é uma peça de teatro, é uma missa, uma celebração ao amor, uma comunhão do amor. Só para ilustrar; no final a Rosane Gofman fala: “abracem seus filhos”. Tinham dois gays na plateia, de mãos dadas, chorando, e uma senhora sozinha, e ela disse que os filhos não estavam lá, se poderia abraçá-los. Foi uma choradeira só. Tinha um rapaz sozinho, chorando, dizia que nunca tinha abraçado a mãe, por que era gay. Muitos exemplos, muito, muito comovente.
“Eu sempre soube” é uma missão, não vaidade. Ganhamos sim, 5 prêmios com essa peça. É uma missão de levar amor às pessoas, reconstruir famílias. O sogro do filho da Rosane era homofóbico, mudou. Uma peça educativa, ela lustra a dor, te posiciona numa sociedade, onde os gays são muito maltratados. Ainda hoje, precisamos explicar que não tem diferença nenhuma entre um gay e um hétero. Todos são filhos de Deus.
Fachetti – A leitura encenada de “A estranha forma de vida”, seu próximo trabalho cênico, já disse a que veio. Vai estrear após a pandemia, tem alguma previsão de data? Discorra sobre esse trabalho inquietante, com texto seu, em afluência com Florbela Espanca.
Azevedo – Eu sempre fui apaixonado por Florbela Espanca. Florbela entrou na minha vida no momento que eu tinha me separado, e ela foi um remédio, um bálsamo antidepressão, que não me deixou cair. Um furacão que passou na minha vida, e ficou. Muita vontade de falar sobre Florbela.
O melhor da vida dela acontece quando ela morre, começa a causar um incômodo muito grande na Europa. Quando a Simone de Beauvoir começa a passar para frente os poemas dela, o Salazar persegue a Florbela. Tive a ideia de trazer para o tempo presente e colocar uma professora que foi pega em flagrante fazendo sexo com o aluno, e essa mulher se suicida.
Acho muito importante tirar a venda que as pessoas colocam no tabu do suicídio. Agora na pandemia, tive três amigos que se suicidaram. Tem que falar que foi suicídio sim. A gente tem que entender que, às vezes, uma palavra amiga, um telefonema, podem ser paliativos que salvem vidas. Estamos muito indiferentes uns com os outros.
Resolvi contar esse texto falando disso, também, falando desse mundo de internet, e recursos tecnológicos – onde as pessoas não falam mais com ninguém, não se tocam. Você ignora o morador de rua, por aí vai. Essas pessoas tem uma história para contar, querem ser ouvidas. Florbela fala disso tudo, e parou no meio da pandemia. A gente ia estrear dia 08/4. Fizemos a leitura, e paramos. Não vou voltar enquanto não acabar tudo isso, formos vacinados.
Vamos voltar, quero viajar o país todo. É muito importante que os poemas dela fiquem mais conhecidos, essa história do suicídio. A Florbela se matou no dia do aniversário dela.
Uma honra e um prazer imenso, contar um pouquinho desse delicioso profissional da nossa cultura.
O Blog/Site, acende os holofotes, sob um artista de grandeza longeva, e com um legado descomunal, em seu ofício, para o desenvolvimento, e o avultado de proporções, para as artes cênicas, e o patrimônio de nossa cultura.
Trata-se do rotundo cenógrafo/arquiteto, de espetáculos teatrais memoráveis – José Dias.