UM PAI E UM FILHO AMALGAMADOS, MISTURADOS, UNIDOS PELAS PRÓPRIAS VÍSCERAS.
O espetáculo “TRIPAS” em cartaz numa pequena sala teatral do Sesc Copacabana, tem texto e direção de PEDRO KOSOVSKI e interpretado por RICARDO KOSOVSKI.
Seu processo de criação foi através de uma residência artística no Lume teatro/Unicamp, com a participação/interlocução de RENATO FERRACINI.
“TRIPAS” é um monólogo performático/interpretativo, que narra o encontro de duas almas, dois artistas; Pai e filho, compartilhando com o público uma jornada de luta, desafios, crenças e descrenças, dores físicas e emocionais, cura do corpo e espírito de dois seres humanos.
Um pai internado dois anos por uma crise de diverticulite aguda.
Rompendo silêncios de espaços físicos e de mazelas da alma. Pai e filho, são obrigados a viver seus embates nesse pesadelo de vida e morte.
Após vencerem nove meses de internação e inúmeras cirurgias, decidem viajar pelo mundo. Daí acontece o grande e surpreendente encontro, não apenas familiar, mas sim, de dois homens, de sentimentos, de descobertas, de possibilidades subtraídas pelo preconceito que nos ronda. Descobertas onde tudo é possível, e é assim que o espetáculo se apresenta. Só quem presencia esse momento cênico catártico, conseguirá entender o que estou tentando descrever.
“Foi transformador! Entendemos a nossa relação”; Assim diz PEDRO KOSOVISKI Pai e filho conheceram o Golfo de Ácaba, fronteira entre Israel, Egito, Jordânia e Arábia Saudita. Aí criou-se a dramaturgia. O pai narra fragmentos de sua história com seu filho.
Nessa viagem geográfica e espiritual, vida e morte se entrelaçam, e PEDRO constrói uma autoficção, como ele mesmo chama, e fala através da arrebatadora performance, através da boca, do corpo, das emoções, do medo, e da enorme “loucura” corajosa de seu pai. Uma fábula sobre a vida de RICARDO e PEDRO KOSOVISKI. Um encontro entre dois artistas . Uma licença poética que os dois se permitem, com muita coragem e ousadia se despem para o público. O pai se despe literalmente e o filho se apodera da onipresença paterna para subir vários degraus da maturidade.
A dramaturgia e direção de PEDRO KOSOVISKI se unem para dar força cênica a performance de RICARDO. O Texto aborda desde o golpe militar de 64, mesclado com a história familiar e unindo momentos hospitalares e particulares/emocionais.
Um texto com grande liberdade verborrágica, com passagens de muita intimidade e sentimento. Uma dramaturgia de amor, cura, desnudamento, buscando uma catarse definitiva, num acerto cênico em que o pai lê uma carta que PEDRO escreve para ele. Uma cena reveladora, tocante, catártica. Um desnudar espiritual/emocional completo, que nos atravessa fortemente. Uma direção feita de coração para coração.
Momento poético quando o músico PEDRO NÊGO canta junto com RICARDO a canção HEY AMIGO, da banda O TERÇO, ícone do rock underground dos anos 70.
Direção musical de FELIPE STORINO de grande acerto e necessária.
Adereços de ALEXANDRE GUIMARÃES somando e intensificando a cena, com a presença de um polvo morto, animal molusco de vários braços, manuseado pelo ator, simbolizando às próprias vísceras, as tripas, a purificação cênica. Uma ousadia em cena.
LIDIA KOSOVISKI cria um cenário de visibilidade belíssimo. Uma cama de espuma inusitada, aparentemente parece de madeira, aí a boa surpresa, valorizando muito a performance e apoiando poéticamente o trabalho do ator.
A iluminação de PAULO DENIZOT e RENATO MACHADO enaltece o espetáculo num todo.
TONI RODRIGUES cria uma direção de movimento que potencializa a cena, dando ao corpo do ator uma força dramática explosiva.
RICARDO KOSOVISKI agarra com unhas e dentes o momento único, ímpar, de mostrar o intérprete que se tornou. Uma maturidade em cena plausível. Deixa aflorar a oportunidade que a vida novamente o presenteou. Uma força dramática/interpretativa vinda da alma.
O espetáculo “TRIPAS” se refere as entranhas, o profundo do corpo e da alma. A chance, o instante de viver e mostrar que precisamos amar, nos permitir, nos jogar sem medo.
“TRIPAS” revela um final emblemático/surpreendente, e que homenageia o teatro, dizendo não a qualquer tipo de censura e preconceito. É um despojamento espiritual do ser humano.
Homenagem ao teatro na sua forma mais intensa de “GRAN FINALE”.