O TEMPO PASSA, À VIDA PASSA, E PERDEMOS ÀS RÉDEAS DOS NOSSOS DESEJOS, DOS NOSSOS SONHOS.
A CIA. DRAMÁTICA DE COMÉDIA volta à cena teatral em seus 24 anos de existência, com alguns prêmios e várias indicações. Em trabalhos de apurada plasticidade cênica e com repertório reflexivo, tem à frente profissionais conceituados, como o diretor JOÃO BATISTA LEITE e outros renomados como: RENATO MACHADO, MARCELO ALONSO NEVES, dentre outros.
Em cartaz no Arena Sesc Copacabana, com texto de JOÃO BATISTA, discorrendo sobre à vida de uma mulher vinda do interior do sertão para o Rio de Janeiro, que ao se dar conta da passagem do tempo, percebe que passou os anos anulando seus desejos/sonhos para cumprir funções na família e na sociedade.
“Numa matéria sobre a terceira idade uma senhora afirmava que seu maior sonho era VER O MAR”. Indagada sobre o por quê de não ter realizado esse sonho, à senhora dizia: “Ah, uma hora é uma coisa, outra hora é outra, o tempo vai passando”.
A dramaturgia de JOÃO BATISTA se apóia na força cênica que à Cia. tem usado para nos trazer à reflexão, uma linguagem de narrativa musical. Utiliza-se das letras das músicas composta para o trabalho, contando à história em confluência com à verborragia desenvolvida.
O texto e as letras das músicas são do diretor, numa escrita de simplicidade unindo-se ao teatral, endossado no decorrer da ambientação. Uma dramaturgia de coloquial linguajar agregada à vida da protagonista, com suas frustrações e almejar desmoronados. Um texto ousado por adquirir um rítmo agregado à personagem central, quase em câmara lenta, exigindo dos intérpretes um convincente atuar. E assim os atores, imbuídos de presença, desempenham o jogo dramático proposto pela direção. Em especial CAROL MACHADO, apodera-se, de uma personagem “enfadonha”, que à atriz eleva, com sua vocação e presença.
DORIS ROLLEMBERG propõe uma cenografia de grande beleza, fazendo alusão ao interior do sertão, de onde vem a protagonista, com uma espécie de “lustre” pendurado no centro, de galhos grandes secos, e pontas desconexas. Belo!
Em contraste com o ar de pouca perspectiva do interior, MAURO LEITE, carrega seu figurino em coloridos, estampados, xadrez, trazendo à imensa alegria que a protagonista nunca conquistou, por se anular diante da vida.
Uma preparação vocal coerente de PAULA LEAL.
MARCELO ALONSO NEVES, numa direção musical em assertiva e satisfatória execução, elevando à cena na teatralidade que é peculiar em seu trabalho.
Um dos preciosos méritos do espetáculo vem da iluminação sempre surpreendente e enaltecedora de RENATO MACHADO. Alternando focos potentes no definir cênico, ele cria um quadrado de luz simples/criativo, permitindo que sobressaia e destaque o trabalho de todos.
A direção de produção de BRUNO MARIOZZ muito bem cuidada.
Um elenco de acertos em interpretações que encaminham o brilhar do protagonismo da atriz.
ANA MOURA, CLEITON RASGA, GISELDA MAULER, LUCAS MIRANDA, LUCIANO MOREIRA e SONIA PRAÇA. Destaca-se com excelência e segurança à defesa de CAROL MACHADO, no desenlace “perigoso” de vida da personagem central. Com hercúlea/seivosa/vigorosa atuação.
O espetáculo “OUVIR DIZER QUE À VIDA É BOA” é ousado, num caminho rítmico vagaroso, ilustrativo do texto, e desenvolvido com teatral/auspicioso, ao defender à vida entediante da personagem, com anulação dos desejos, ânsias, e sonhos interompidos, em estar diante/dentro da imensidão do mar, da vida. Uma mulher que se rende ao massacre de uma sociedade esmagadora, sendo usurpada de seu mais singelo e longínquo almejar: conhecer lugares, sentir-se dona de seus direitos, “abraçar” o infinito/mar, etc… Como ela mesmo diz: “Ah, uma hora é uma coisa, outra hora é outra, e o tempo vai passando, à vida vai passando.
Vale muito conferir essa empreitada de ousadia.