Crítica Teatral de “Vim assim que soube”

MOMENTO DECISIVO/LIMÍTROFE, EM CENA LÚDICA/TEATRAL, ENTRE À VIDA/MORTE, CELEBRANDO À ARTE.

“Ele, homem com uma doença terminal. RENATO CARRERA convidou sua grande amiga CRIS LARIN para dividir à cena.

Sua paixão, enfermeira, cúmplice, e ela diz: “VIM ASSIM QUE SOUBE”.
Com texto de RENATO CARRERA, encenação de MARCO ANDRÉ NUNES, e protagonizado por CARRERA e LARIN.

“Amizade, afeto, medo, amor, perda, trajetória, alegrias, faltas”. Esses sentimentos são o mote que nos “choca”, impacta, e nos faz refletir, e muito, no texto que RENATO escreve em cena, beirando o dia de sua partida, nos fazendo rir querendo chorar, pensar sobre o ofício do ator, e o que fazemos nesse mundo.

“O que você vai deixar? Para quem? Quem cuidará de você quando chegar a sua vez? Quanto vale uma amizade”?

O espetáculo é impactante, chocante, implacável em sua urdida cênica. Mistura realidade e ficção em sua licença poética. A presença da morte fortemente exaltada, em meio á lembranças, alternando dor, humor, talento. Amigos/amantes da vida e da arte, reviram, expondo momentos saudosistas, de volúpia, numa época em que trabalharam, dividiram no teatro, o que tinham de melhor e de pior para oferecer. Mágoas, afetos revoltas, cobranças, paixão, taras, numa interdependência com a fragilidade/vulnerabilidade humana, culminando na temida morte de cada dia, que nenhum de nós escaparemos.

Um clima mortal, o medo e a revolta permeiam o ambiente que CARRERA propõe, em coloquial escrita, que nos arrebata e nos faz rir, nos emociona, e muito.

A dramaturgia de RENATO narra em primeira pessoa, envoltos de muitas sensações/indignação, o quanto valemos ou não como seres humanos e artistas. O medo e a proximidade do apagar às luzes, nos paralisando em nossa persona. O quanto o ofício do ator de teatro é vulnerável em relação às outras artes. Teatro não notabiliza os atores, como faz à arte do cinema, plásticas, etc. Essas, deixam um legado que não é esquecido. Tem documentos “palpáveis”, tornando-se vivas para sempre.

O texto/espetáculo é um manifesto irrefutável/belo e imprescindível, homenageando todo tipo de artista, presentes ou ausentes no cenário artístico.

Com direção de produção de CLAUDIA MARQUES, numa cenografia totalmente branca/geométrica, de DANIEL DE JESUS, nos acalentando os olhos com o branco da paz em contraponto com o denso mortal, de beleza visual, e eficiente em sua geometria.

NINA COSTA REIS dá ao figurino o acerto adequado num tom quase no preto/à beira do fim.

Um desfrute talentoso que nossos ouvidos comprovam, e de exatidão apuradíssima incluso na trilha sonora de FELIPE STORINO. Momentos densos, de suspense, em fluir perfeito no fomentar cênico.

A direção de movimento nas mãos de LAVINIA BIZOTTO flui em alternância de gestuais coreografados, em conectar bem costurado à densidade e ao humor presentes na cena. Intensifica positivamente às atuações.

MARCO ANDRÉ NUNES, com assistência de DANIEL BELMONTE, cria uma direção no oscilar com o videografismo projetado por PEDRO CADORE, conferindo uma importância letal em projeções. Uma direção cerrada, consistente, com rigidez no tom bem humorado contido no texto em vários momentos, impondo ao espetáculo um frondoso e necessário pulso ao conduzir uma delicada escrita com presença lúdica. Delicadeza que RENATO MACHADO em sua total e imponente iluminação nos confere. Uma luz de sutileza preciosa.

“VIM ASSIM QUE SOUBE” nos move, comove, encanta, nas experiências imprimidas por RENATO CARRERA e CRIS LARIN. 

Num mesmo caminhar de vocações incontestáveis, RENATO na sua ânsia indignada/teatral, em letalidade constante. CRIS corrobora com sua lealdade amiga/enfermeira/artista/mulher, onde se doar é o grande mérito dessa empreitada tão bem sucedida/delineada, que ficará marcada na cena carioca.

Lealdade é a palavra chave que os cristalizam como artistas/amigos/amantes da vida e na arte.
Com lealdade celebramos os encontros teatrais.
Com lealdade fazemos valer uma grande amizade.
Quando não tivermos nada a mais a oferecer ao outro, se embrenhe no universo da lealdade, ela permeia tudo.
O que podemos deixar como legado? Um pouco de lealdade, o resto vira pó, morre.

“VIM ASSIM QUE SOUBE, E TROUXE À LEALDADE”.

Corram! Assistam!

Show CommentsClose Comments

Leave a comment